quarta-feira, 10 de março de 2010

Contos Imediatos XI


SURREALISMOS MATUTINOS

Para Negrinha

De assalto, o mundo acordou no quarto. Depois que o sonho sonhou o homem, a vida abriu os olhos e as ondas do mar quebraram com o zumbindo oco de sempre. O dia nascia no sol, que mostrava o claro sem traçar os raios. Na ponta da costa, navegavam aviões sem asas, cheios de gente acostumada para o horizonte que despencava. Os cabelos sentiram a cabeça e, deles até os pés, tudo estava vivo e contínuo. A preguiça se espichou pelos dedos dos pés em ginástica adormecida. A areia saltitava no meio do mar, e quando olhou, o mar se espreguiçava para acolá. Invertido, o mundo que nascia, parecia fazer dormir o sol, que recém acordava. Nadou até a areia, e pode compreender como era o parto das ondas. Na roda dos velhinhos madrugueiros, o ancião galanteador massageava, como que em migalhas, uma a uma, as senhoras. E elas brilhavam na luz calma dos seus tempos mansos, em cada passeio dos dedos dele. E eram os sorrisos delas que acendiam aquele sol todo. Do mar brotou inteira uma orquestra que copiava sinfonias de Vivaldi. Todos os ares se encheram de peitos para ouvir. E a suavidade parecia cheia de acordes cor lilás. O azul ficou cheio de céu. O norte banhava de raios a nuca cheia de sensações, enquanto ao sul cabia a volta das pêras do rosto, já que as maças terminaram café dos peixes. Em segundos, a areia toda ficou pipocada. E as pipocas que olharam dos buracos na areia, pareciam caranguejos inofensivos e anódinos. Uns preferiram surfar na cadeia das nuvens, enquanto os lembrados preferiram lembrar de esquecer. Enquanto o mar sentia o calor dos pés, o violão de cordas tocava canções estratégicas nos dedos do violeiro. Uns dedos cheios de afinação, por sinal. Os peixes beijaram os ares e dançaram tangos enfeitados com as velinhas massageadas. O azul do céu se legendou como amarelo. As sensações voaram oceano adentro quando o relógio apontou para o sete, que era todo nordeste a essas alturas. E com a hora sete, aquela ilha matutina se fechou no abrir das cortinas. E tudo terminou quando o dia começou. Pois era hora de desorganizar o mundo para que a desordem acostumada de sempre, voltasse a reinar com seus óculos fundo de garrafa.

PFF

Nenhum comentário:

Postar um comentário