quarta-feira, 15 de agosto de 2012

direita-esquerda-volver






Temos que ler demais, saber demais, ter demais. Bastante equilíbrio. Bastante foco. Bastante planejamento. Produção, prudência, provocar sem torrar a paciência alheia. Autocontrole. Autoconhecimento. Automóveis. Economizar e viajar. Amar e trabalhar. 

Cuidar de si sem esquecer dos outros. Se reconhecer no outro, essa grande porcaria que os psicólogos falam cheios de razão. Recolher-se no mato dos mosquitos e adequar-se ao ruído da cidade que fede e está cheia de asfalto. Manter o cérebro ligado, o corpo são, a mente stand by: tudo ao mesmo tempo. 

Importar-se, mas assim meio indiferente. No fundo no fundo o destino já comeu o cú da vida, e por trás, e sem ela ver, e dormindo, e sem cuspe, e a liberdade é só um imã de geladeira. Aprender uma língua nova, falando bem, antes, a que aprendemos primeiro, e usando a língua nos finais de semana, e também durante a semana. Lamber e ser lambido. Sorvete e bucetas. Cultura, o mundo antes do pecado original, natureza intacta, tudo no mesmo saco. Saco de lixo biodegradável e sacolinhas plásticas de mercado que voltam para o inferno depois de 100 anos de espera. As sacolas de plástico venceram o homem. O homem não é todos em 1, e também as mulheres. Os homens e as mulheres morreram e existem "estilos". Todos são de um jeito, e vão querer dizer e mostrar. É o ponto narcísico de depois do espelho.

O porteiro e os intelectuais. Os intelectuais sabem tudo depois que leem Kakfa, psicanálise, Clarice Lispector, e acabam não sabendo apenas porque QUEREM saber. Querer é a fonte de todo engano. Os franceses falando com todo aquele charme, comendo pão baguete, macdonalds e yoakissoba. A dor para sempre revelará as portas do fundo que levam até o jardim e que convivem, mansas, com as portas da frente que permitem ir embora.

Ser da pele para dentro mas dominar TODA a natureza sem fazer com que ela morra. Cuidar da comunidade, sem esquecer dos goles do ego. Latir e meditar. Escutar mais e sempre, falando as vezes. Falar, falar, falar. É esse ter que dizer da vida que torna ela um excesso de todas as coisas. Seríamos mais pássaro sem qualquer vocabulário, e os pássaros estão lá, voando, e rindo das nossas caras sérias. Escrever é escrever sempre e até quando não se está na frente do teclado ou com a caneta enfiada nos dedos como um pau que não para de ejacular. Escrever com lentidão e rapidez, pra controlar o orgasmo. Assoprar a poeira das letras e expor uma peça feita, e também mostrar o vômito indigesto de cada palavra que se une a outras venenosamente, brutas e selvagens e quentes como sangue. Um dar o pescoço e ser vampiro. 

Colocar fogo nas cinzas depois de um incêndio assassino. Estar com o mundo na tela e nada ao redor. E as golas das camisas? ...estão em transe, são de um jeito x, y, z, beta, gama, alfa, e mais a puta que pariu. Marx acertou. Os liberais acertaram. Os economistas e seus pitacos de merda acertaram. A nova era espera e os retrôs acreditam no pirulito da infância. 

O homem do tempo e sua margem de segurança de 15 graus pra acertar sempre. Os riscos calculados como um computador que elabora a melhor jogada de xadrez na frente do humano orangotango. É preciso concentrar cérebros dentro de um computador e preservar a "individualidade". A saúde é global, barba, bigode e costeleta, mas os médicos são especialistas na especialidade. Corpo, alma, espírito de porco. 

Os sistemas são os culpados e os psiquiatras dizem que temos que lidar com a própria culpa. Deus quis assim, mas os ateus assaram Deus. E comeram o coitado como um churrasco de final de ano, com presentes e chopp e tudo mais. Nas entrevistas de emprego todos têm o mesmo defeito, fazem e dão o melhor e nunca estarão mal humorados. Em casa todos são assassinos, cruéis, filhos da puta por completo. 

As putas amam os filhos. As senhoras que vão no mercado e fazem reiki e assistem a novela também. O avião é um ônibus sem rodas. Os ricos preferem ficar em casa porque os aeroportos já são alguma coisa old fashion, enquanto os pobres tiram fotos de todos os lugares e revelam e mostram o álbum para os colegas de trabalho. Há uma roda de choro, e há um blues americano. E talvez haja o silêncio.

O constrangimento rebelou-se, o despudor só quis gozar rápido pra poder dormir, a paciência virou santa. Até os santos têm medo de que suas varinhas estejam broxas e precisando de uma injeção de viagra etéreo. 2000 mil músicas por um LP.

Retroceder a vida para apressá-la. Um abraço imenso transportado e escoltado pela patrulha das estradas que cobram pedágio e que vão avisando que o negócio ocupa quase duas pistas pra passar. A overdose quase morreu, mas passa bem.

"garçom, 39 doses de tempo, com bastante gelo...e peça pra que ela mostre mais."




sexta-feira, 10 de agosto de 2012

passei um café inda escuro, e logo me pus a cantar...






Elas transitavam pela casa.
Bebendo vocka.
Uma queria a outra.
A uma era um andrógino transcendente, um anjo integrado.
A outra era tímida, nunca tinha beijado outra menina.
A tímida foi trocar de roupa.
Trocou a calça por uma bermuda.
Aí perguntou se a bermuda tinha ficado bem, naquele corpinho novo e pequeno e delicado.
Dissemos que a calça ficava melhor.
Então ela pôs de novo a calça.
De calça ou bermuda,
era uma fruta intacta do jardim do Éden,
tinha 18 anos,
um charme vindo de algum nascedouro charmoso.
Tinha uns passos que não pesavam.
Ria como se fosse uma egípcia cobiçada por milhares de escravos a mais de 20 mil anos atrás.
O peito era um assunto à parte.
Um apenso.
Um anexo.
De arquitetura escondida entre uma blusa branca e um casaco branco e um colar que fazia curva na divisa dos dois peitos.
Alguns peitos são tão unos como Deus que chegam a merecer CPF, RG, cadastro na Polícia Federal.
Como peregrino do amor, cartografei dezenas de peitos na memória.
É meninice pensar que o volume é a grande qualidade de um par de peitos.
Um peito é o cheiro da pele que embrulha o peito,
é enlevo na dança das carnes,
é o arrepio do peito.
Um peito é a copa.
Como a copa das árvores coníferas, o peito é a agressão do corpo em relação à vida.

Vimos o trailer do filme Vicky Cristina Barcelona.
Elas queriam dar para o Javier Barden, como todas as mulheres do planeta terra.
Então foram tirar mil fotos juntas, como fazem as meninas jovens.
Minha profissão era observar, nunca fiz nada melhor.
É uma espécie de transe.
Observar é um retiro que se faz no meio das coisas que acontecem na vida.

Mas voltando à peituda:
olhei melhor e no final do colar havia uma cruz.
Pensei em dizer que ela tinha peitos religiosos, mas achei que ia parecer sem graça, como de fato é.
Então tocaram o interfone.
Era a comida.
Enquanto uma foi buscar a comida, fiquei olhando a menina tímida e peituda e divina.
Pensei em estupro, mas achei que seria complicado encarar um presídio.
No fundo no fundo só estupro a mim mesmo.
Pensei em hipnose, em projeções pra fora do corpo, naquela nudez vestida de branco, no efeito estufa, nas tetas das índias xocleng que caem com o tempo, na vitória do peito dela sobre a força da gravidade, na madureza física, no jogo do inter que estava por começar, na mulher perturbadora que ela seria com 30 anos.
Cheguei perto, mas já estávamos próximos.
Era estranho, mas era.
Talvez tivesse sido minha amante em vidas passadas.
Ou uma amiga, ou uma faxineira daquelas que seduzem meninos de 12 anos.
Ela tinha um rabinho pequeno, charmoso, europeu.
Tudo estava ali, pulsando.
Dei um beijo no canto da boca,
naquele lugar entrevado onde o quando construiu uma casa de dois andares, com piscina e drinks doces e pesados de álcool.
Tenho sido fiel à ilusão, esta amante envenenada.


Baron de Condesexto

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

os silvos inauditos



Quando encontraram-se, as duas solidões sentiram mútuo pesar. Olharam-se fundo no fundo dos olhos, que é o lugar que guarda o todo e o nada. Não suportaram o que viram. As solidões voltaram para casa, repousando suas solitudes, suas costas, suas unhas encravadas. Descansaram a carne dura numa banheira morna, até murcharem os dedos e sorrirem de descanso os músculos. Bebericaram delícias e provaram a própria unidade. Alimentaram as plantas que já quase moribundas. No vão do sono, cada uma delas fragmentou-se em muitos pedaços. Dividiram-se até dizer chega, espalhando-se impetuosamente em algum lugar sem nome, talvez fora do mundo batizado de mundo. Foram, cada uma em seu endereço, até o fim que sempre espera tudo que existe. Reencontraram-se num átrio solene que tinha ares de sala de espera. Uma sorriu. A outra também. A mão direita de uma beijou a mão esquerda da outra no transe dos dez dedos.