segunda-feira, 30 de maio de 2011

sábado, 28 de maio de 2011

quadra incompleta da última inspiração ou soneto do desabraço







O tom de Queda que na queda havia
fez da canção de espinhos, verdade anestésica pelo verbo teu.
Esperando cólera, acordei celestial da luz do dia,
em paz com os infernos meus.

Não houve vencedores,
mas apenas um temporal engano.
Ao final éramos empatadores,
em paz, em outro plano.

Se até agora
a saudade era uma insegura interjeição
de "Nossa Senhora", ou "Meu Deus"!!!

Agora
a paz é nossa promoção,
nosso caminho, nosso infinito Adeus.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

QUANDO OS SINOS SINAM

Uma vez vi um documentário sobre um clã indiano que se organizava de tal forma a sempre ajudar os clãs vizinhos. A comida, por exemplo, era fabricada, plantada, colhida, transportada, preparada e distribuída por esse clã, que era chamado de clã dos Surugtánga (inventei o nome, óbvio). (tem umas mentiras que são óbvias e só os conformados, os inseguros e os egoístas conseguem perceber e ficar calados, como se óbvio travestido travestisse a verdade de suas bocas).

Os Surugtánga sempre alimentavam todas as outras tribos vizinhas de forma gratuita e amorosa. Como se houvesse – aos moldes de hoje, em tempos em que se tem como princípio afiançador da realidade o referencial da obtenção de vantagens e privilégios – uma comunidade de vagabundos que ficasse só mamando nas tetas de uma comunidade de ordeiros e compenetrados trabalhadores. Nesse país, os ricos serviam e os pobres banqueteavam. Aqueles que serviam diziam que estavam servindo à Deus, já que, segundo os preceitos de seus livros sagrado, alimentar outra alma era alimentar a alma de Deus. A recompensa pela satisfação do pantagruélico Deus era o alimento plural enviado em pacotes invisíveis que vinham pelo sistema de sedex dos céus.

Dito isso, pergunto: qual escrito ou livro não é de autoajuda? Os que se autodenominam como "intelectuais", escrevem sem perceber que, quando escrevem, a única coisa que verdadeiramente fazem é promover uma autoajuda que em geral serve pra satisfazer a fome da sua própria vaidade. Em geral os que se autoproclamam intelectuais acham o ceticismo um perfume francês charmoso. Os intelectuais, tal qual Narciso, usam o ceticismo para pregar a descrença e a sua profundidade em assuntos pra lá de stricto sensu.

Pra aprofundar, escrevem. Aprofundam-se num falso saber "universal" na mesma medida em que se ajoelham na terra, para que seu reflexo possa parecer cada vez maior no espelho da água do riacho... No instante anterior ao momento em que o próprio nariz encoste na água e, acometido de uma overdose de realidade, perceba a baixeza das alturas habita. Os intelectuais têm certeza que autoajuda é sinônimo de fraqueza, odeiam Paulo Coelho porque Paulo Coelho, em sendo vendido às vastas multidões, não tem os ares nobres reservados exclusivamente aos selecionados divinos que não precisam de transcendência para compreender e sentir tudo de todas as maneiras, como já poetou o facetadíssimo Fernando Pessoa.

Os “intelectuais” então escrevem todas as verdades. Secas e verdadeiras. Fantasiosas e verdadeiras. Enchem as estantes das livrarias de tantas verdades. Formam missionários da verdade ensinando a verdade aos quatro cantos.

Os crentes, do outro lado da trincheira, dizem dando de ombros:

- pobres intelectuais, cegos intelectuais. Todos esses ditos deles já foi outrora dito nos livros sagrados.

Quando chega a noite, o intelectual encontra Deus nos próprios pesadelos, sonha que têm todos os livros do Paulo Coelho autografados em sua biblioteca particular. No sonho do crente ele é vencedor de uma loteria em que o mais elevado prêmio é toda a sabedoria terrena e todos os melhores insight’s poéticos reunidos em um kit mágico com um broche luminoso que diz: “APRENDA A ME USAR, PERGUNTE-ME COMO”. Ambos acordam e dormem, e acordam e dormem, e acordam e dormem, e às vezes até discutem, o intelectual mentindo que aceita qualquer coisa bem fundamentada, o crente mentindo que crer por crer é convencimento bastante...

Enquanto isso, os pescoços de ambos ficam à mercê da imensa corda fabricada para servir de forca chamada paradoxo. Os intelectuais escrevem pra encontrar a saída do labirinto, pensando que perder-se no labirinto é charmoso. Os crentes acreditam piamente que já estão fora do labirinto, sem perceber que o labirinto é uma invenção que satisfaz as necessidades das suas fantasias maniqueístas. Os crentes acreditam no destino. Os intelectuais acreditam na sincronicidade. Os crentes acreditam em Deus. Os intelectuais acreditam que não acreditam...O grupo dos intelectuais sente que, no seu grupo, existem crentes disfarçados. Os crentes tentam converter intelectuais que eventualmente se aproximem do grupo da fé. Criançolas.

*

Enquanto o paradoxo não for assassinado a sangue frio, deixando suas vísceras expostas e à vista dos abutres comedores de vísceras podres dos outros, não será possível compreender que qualquer explicação ou negação de Deus nunca será capaz de não estar contida em qualquer escritura que possa ser qualificada de sagrada ou num escrito intelectualmente “elevado”. Que se foda o clichê, a pouca fama do já dito  e o chavão, mas a faca mais afiada pra se passar na goela do paradoxo é o amor. Mas provavelmente não esse que você está pensando. O amor que vem da única overdose que não mata que é a overdose de amor...essa outra ferramenta paradoxal...

Os Surugtánga eram na verdade grandes egoístas. Mas eram egoístas altruístas. E, portanto, grandes altruístas que amavam os outros pra safar a própria pele. Eram santos venerados e filhos da puta da pior espécie – e tudo ao mesmo tempo porque, por lá, tempo também é dinheiro e mais possibilidades. Os Surugtánga eram o clã mais equilibrado, saudável e rico – tanto de desnecessidades quanto de riquezas – daquele vasto país.

ALTAS E BAIXAS FILOSOFIAS


- Legal isso que você disse, altas filosofias.

- Altas e baixas filosofias. Esquecem seguido das baixas.

- Pois é, acho que as altas ficaram mais na moda, caíram no gosto dos pensadores do povo.

- É, deve ser por isso que hoje o retrô voltou a estar na moda.

- Existir desde todo o sempre, que ninguém na verdade sabe aonde está porque aonde está não existe a palavra aonde, é como um coração que pulsa e nunca pára, como o eterno movimento de avanço e retração da borda do mar na areia...Sabe a areia?


terça-feira, 24 de maio de 2011

NORMALMENTE






Eu gosto de estar com os doidos porque gosto de estar do lado de gente normal. Quanto mais louco eu vou ficando, mais vou entendendo o que é ser normal, mais achando insano ser igual. Pena que ainda sou louco de menos, mas tenho metas de endoidecer à medida em que os cabelos ficarem brancos ou cairem, lá pelo outono da vida que é quando as penas para o crime de loucura ficam mais amenas. É engraçado ver que as crianças e os velhos, ou seja, aqueles que estão mais perto do estado de não-vida, são os mais próximos de uma liberdade louca usurpada dos seríssimos adultos sapientes de meia idade.

Meus cabelos não vão cair. Eu sei que não. É porque corto o cabelo de forma programada a partir das fases da Lua. A Lua é foda! A Lua é pra quem ainda acredita, tanto em cabelos quanto nos sentimentos e sensações sutis (Deus e o Diabo entram aqui). Claro que cortar o cabelo na lua crescente e no dia correspondente ao horário do próprio nascimento pode ser considerado coisa de gente insana. Mas brotam cabelos pseudoplacebos em mim de um jeito impressionante e mágico, logo em mim, que brotei numa família de carecas.

De todo modo, é engraçado perceber que a incompreensão é batizada de loucura pelos outros. É como se retribuissem a incompreensão com um soco chamado rótulo, que vêm lá da puta que o pariu mais primitiva que temos dentro de nós, no lugar tosco onde só sabemos fugir ou lutar. Nesse lugar tosco não há uma mesa de bar em que se possa sentar, conversar, tomar uma cerveja e depois buscar algum entendimento. É quase sempre os caminhos entre os diálogos que mostram alguma verdade, como um raio que ilumina a floresta escura e logo depois esconde a verdade na imagem que captamos no cérebro naquela ínfima fração de segundos. Esse alerta sobre os esplendores da dialética o Platão já nos fez antes de Cristo renascer do reino dos mortos, mas, como sempre é difícil entender coisas difíceis, ele é até hoje rotulado de um masturbador mental que morreu no campo da teoria e esqueceu da prática que é o quartinho onde o Tio Patinhas guarda suas moedas de ouro empoeiradas...O "sei que nada sei" morreu com o velho Sócrates que não tinha muitos problemas com a própria vaidade e por isso não escreveu porra nenhuma.

A loucura tem mais cores. Já pararam pra ver a cor dos carros na rua? O espectro vai do preto ao branco, passando pelo cinza e todas outros tons de cinza e de cor de merda mole correlatas. Os carros amarelos/roxos/verde-limão geralmente são dos publicitários que tem a sua loucura chancelada pela profissão. A loucura é mais legal. A loucura permite encontros, permite passos mais largos. Permite usar o passarão e o passarinho no mesmo ambiente, sem que haja um arquiteto positivista dizendo o quê "casa bem" com quê. Mas, para que os músculos da perna aguentem, é preciso, antes, um passinho meus caros passarãos. Um passinho que pode se dar evitando esse impulso mediocritas de batizar como loucura a incompreensão. Talvez esse possa ser considerado o  primeiro passo para tornar-se normal, que é o estado infinito e personalíssimo de autenticar esse monstro bondoso chamado você que dorme dentro de você. Ou alguém vai permtir uma carequice gratuita ou um autonaufrágio na própria piscininha inflável de 1000 litros?  

quinta-feira, 19 de maio de 2011

amar, amar y tuvo muerte lenta!



O estado de vigília trouxe a poesia do Fito fragmentada em único verso da música Sasha, Sissí y el Círculo de baba, que diz: AMAR, AMAR Y TUVO MUERTE LENTA...

Tenho amado do ctônio ao celestial. Do céu ao inferno. Do além para o acolá. Tenho amado vocês, você, tudo que eu vejo, tudo que você não vê. Tudo que eu esqueço. Tudo que você não sabe dizer. Tenho amado por tolerância e por egoísmo, acariciando o meu ego porque, antes, há uma união entre o que é meu e entre o que é plural. Tenho amado os mortos, os vivos, os morto-vivos. Amado as crenças por observação de que são um brinquedo. Estou assim por pureza de um estado que não se sabe como começa e até onde aguenta sem cansar. Ou se trata de uma condição permanente? A morte é manipulável, o amor, uma gasolina, uma comida, um gerador de energia vital. Eu não canso mais. Eu não sinto mais. Estou entregue ao final dos jogos, no quando não importa a delícia da vitória nem a cólera da derrota. As pétalas de flores coloridas jorram afetos pelos caminhos que piso, pelos lugares que imagino sem pisar. Há uma igualdade possível e por isso palavras como essência, pureza e verdade voltam a sentar comigo nessa grande mesa deste Ághape incessante. Amou, amou e teve morte lenta! Quantas músicas escondem tanta verdade que nossos ouvidos não escutam!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Unhas? Ainda?


- exemplo nojento de uma mão nojenta com unhas mais que nojentas -


Em média gastamos 1 minuto para cortar cada unha de cada um dos dedos da mão. Assim, são 10 minutos para aparar as garras das 2 mãos. Considerando que em média é preciso cortar as unhas 3 vezes por mês, gastamos 30 minutos por mês para essa tarefa anticontemporânea.

Por ano são 360 minutos gastos meditando enquanto cortamos as unhas das mãos. Tendo como hipótese que alguém viva 70 anos... - se bem que eu vou viver até os 81, ou seja, vou morrer no ano 2064, então, tomemos os meus 81 como referência já que essa pesquisa é minha. Vivendo 81 anos uma pessoa humana (?!) gasta em média 29.160 minutos cortando as unhas das mãos.

Se acrescentarmos à esses minutos os outros minutos gastos com os cascos do pé (sim porque toda unha de dedão de pé é um casco asqueroso), o tempo gasto aumenta. Com o pé a preocupação com o aparamento é menor por dois motivos: os calçados e a ciência. Os calçados camuflam a cena nojenta quando a preguiça é maior que a vontade de não ter uma garra felina. A ciência explica sem explicar que as unhas do pé crescem 3 vezes menos que a das mãos. Vai ver as duas coisas estão associadas e são as meias e sapatos que abafam o crescimento das unhas dos pés. Como aquelas experiências do colégio em que o fogo apagava quando tampávamos a vela com o copo.

Se essas duas condicionantes estão certas, um homem com um grau normal de porquice como eu gasta mais 120 minutos x 81 anos de tempo com as unhas dos pés, o que contabiliza 9.720 minutos. Esses 9.720 minutos gastos com os pés, somados aos 29.160 minutos gastos com as mãos, resultam em 38.880 minutos gastos cortando as unhas durante uma vida inteira de 81 anos. Isso pra mim. Se você for viver mais ou menos que isso, faça suas prórias contas.

Vamos às regras de 3, que são a única coisa que eu sei fazer em se tratando de matemática (e com calculadora... a invenção que acabou com a matemática escolar...porque as crianças ainda tem que estudar

   60 minutos -------- 1 hora
38.880 minutos---------- X

60x = 38.880
x = 648 horas


logo,

24 horas ------- 1 dia
648 horas-------X

24x = 648
x = 27 dias!!!


Logo, ficamos quase 1 mês cortando as unhas no intervalo de 1 vida. Porque essas unhas não param de crescer hein? Melhor seria dormir nesse tempo. Que Deus mantenha as unhas apenas nas mulheres nas próximas gerações.

terça-feira, 17 de maio de 2011

HELÊNICA





Na rua o molhado da chuva
refletiu tua boca como imaginura encantada.
Na rua a chuva fez trégua e,
mesmo assim,
em mim,
os pingos ainda te pingavam.
Os pingos fizeram em mim uma chuva inteira de ti.

Não é no pensamento que tu vens à mim,
mas eu é que vivo nos teus lábios,
e nesse insuportável celeste felino dos teus olhos -
lar de tantos abismos.

Pela luz molhada da rua
pude voltar à tua boca que,
às alturas escuras de um domingo
e mesmo nas alturas da semana,
vibram em mim como uma salvação
que salva do aquoso desses teus olhos sem nome.

Mas tua boca sangrou e,
sentindo o cálido gosto doce
do sangue que acariciou os sulcos da tua boca,
abri meus olhos,
tão confusos quanto helênicos.
O aço dos teus olhos, em feitiço,
transformou o caminho já morto atrás das minhas costas em mortal abismo.
Eu não mais poderia voltar à minha ancianidade.
Gritei por Helena... a que sempre esteve.
Em Tróia e sabe-se lá em qual outro canto da memória.
E fiz da intuição meus olhos,
porque ainda sou aprendiz da minha história.





segunda-feira, 16 de maio de 2011

INDÍCIOS





Não se sabe se aconteceu há séculos,
ou há pouco, ou nunca.
Na hora de ir para o trabalho,
um lenhador descobriu que o machado tinha sumido.
Observou o vizinho e comprovou que tinha o aspecto
típico de um ladrão de machados,
o olhar, os gestos, a maneira de falar...
Alguns dias depois, o lenhador achou o machado,
que estava perdido num canto qualquer.
E, quando tornou a observar seu vizinho,
comprovou que não parecia nem um pouco um ladrão
de machados, nem no olhar, nem nos gestos,
nem na maneira de falar.

Eduardo Galeano

quarta-feira, 11 de maio de 2011

SUTEMÁTICA: a temática surreal



Tanto tenta o pequeno homem dominar a gnose toda desse vasto império da existência. E o faz com o cochilo de seus sentidos. E meio assim aturdido, sem compreender e limitado a perceber, acaba batizado de batizador... o que não se constitui como um paradoxo propriamente dito, mas como um paradoxo impropriamente dito. E repete sua pequena história, que são as mesmas e cansativas histórias do mundo e que só mudam por conta dos diferentes títulos, como se os mesmos textos tivessem títulos reinventados...

Esse vício é de quase todos, e pode até ser que seja uma virtude que só compreenderemos quando o universo entender que é mesmo Uno. Uso o “quase” apenas pra não ser taxado de absoluto. Inescapável aos poetas, aos gênios, aos senhores respeitados e não respeitados (quê diferença há entre ambos?), aos anônimos que sentem e não batizam os sentimentos pois sentem sem necessidade de entender. Sentem e só. Como à maioria dos homens e mulheres sói assim acontecer.

São sempre os grandes e arquetípicos temas: medo, amor, morte, angústia, guerra, sexo, heróis, paixão, astúcia... parece que a criatividade esvaiu-se. Os sentimentos e sentidos só mudam mesmo de endereço, ou de email para já atualizarmos esse dito clichê que como tal são sempre ditos demais. As sensações são como uma família que muda de casa. Se a casa for maior ou diferente da de antes, continua a ser uma casa.

Ou – pergunto – essa tal alteridade, que anda cheia de moda e livros perfumados de novo, não é apenas o velho conselho de que nossa liberdade termina no limite da liberdade do outro? A velha questão da tolerância para com as nuances do outro que quase sempre são a nós insuportáveis porque, além de não virem de nós, são completamente diferentes das que vêm de nós...Do time de futebol que se torce até a posição e os parceiros eleitos para nos fazerem gozar. Acrescente-se nesse atualíssimo conceito difundido de alteridade um convite para que se convide o Outro (o alter do conceito) para um café com bolachas ou uma ida ao puteiro ou qualquer outro gesto de materialização do afeto. Um convite em que passemos a usurpar nosso próprio limite para que se cumpra a histórica regrinha de boa vizinhança, ainda que o Outro seja o maior filho da puta que existe na Terra, afinal, é preciso dar a outra face como ensinou Jesus quando cruzou por essas terras maculadas e benditas (sim, ao mesmo tempo).

Esses assuntos sobre a moralidade humana, esses choques entre revolucionários e naturalmente conformados, entre os crentes em Deus e os que dele se riem, entre capitalistas e socialistas e indiferentes, entre bondosos e malvados das fábulas da Disney, entre puritanas e sádicas, entre ociosos e trabalhadores, todos esses falsos confrontos disfarçados da mais pura vontade de domínio sobre o outro e sobre o resto, tudo isto e o que mais possa haver já encheram completamente o saco. Estão perfumados com talco, que é o cheiro por excelência de tudo que é velho e que está prestes a morrer de forma “delicada”. Assim, as histórias e tudo o que se diga (inclusive isso), só valem pela pitada de pessoalidade de quem as conta.

Por isso vejo na honestidade uma espécie de saída de emergência. Mas uma honestidade ainda maculada pela moral cristã e moderna e (sim) contemporânea. Sem honestidade de verdade, os temas seguem rondando as mesmas tensões, os mesmos falsos dilemas da nossa fantasia. Porque inventamos os dilemas se eles são produto da fantasia? Porque choramos a morte se a morte não morre? Porque queremos mais amores e mais dinheiro se, ao final, não vamos precisar de nenhum dos dois? Porque queremos consumir uma bunda gostosa se, ao final, vamos ejacular sozinhos? Porque os medos se é no espelho que encontramos os piores demônios? As temáticas da vida andam chatas demais. Tudo já foi dito, todos os filmes já foram feitos. Todas as guerras guerreadas. Até essa minha ode à canseira por certo já foi reclamada.

Tudo que a civilização aprendeu até hoje poderia ser resumido em uns pequenos postulados que poderiam ser agrupados numa Bíblia Resumão ou numa Constituição de poucos artigos. E tudo o mais que se quiser dizer, deixaremos de material para encher futuras linguiças filosóficas. Material a compor as sessões de livros promocionais que tem as mesmas coisas contadas por gente desconhecida e sem nenhum plano de marketing editorial. Esses postulados que já foram delimitados por tanta gente. Essa recorrência de argumentos mascarada de concorrência de argumentos. Uma contraposição de causa e efeitos (que serão os mesmos com nomes novos).

O que escapa desta regra: respeitar a si, aos outros e ao meio ambiente? Desenvolvimento sustentável... só se for da nossa santa paciência. Que saco ser tão educado! Pregar respeito ao meio ambiente e continuar comendo 500kg de carne em todo churrasco de domingo como uma hiena do Discovery? Que cada um possa viver dentro da sua garrafa do jeito que quiser, dessa garrafa desnorteada que bóia no mar de brinquedo de um pessoal que não conseguimos enxergar porque são grandes demais aos nossos olhos terráqueos. Mas basta dessas pregações! Basta de querer ver Outro ferrado só pra alimentar nosso saco de honrarias! E quem disser que isso é subjetividade ou loucura será igual aos que não disserem nada e rirem com um sorriso encabulado de quem não entendeu porra nenhuma. Na verdade eu também não sei o quê quis dizer, mas sou um filhote da intuição e, por isso, repito esse grande tema sem tema que é o caos. Abiantô, chatô, alô alô alô...alguém na escuta?!

terça-feira, 10 de maio de 2011

sábado, 7 de maio de 2011

VINHO DOS CORPOS DE PLUMA




Sei que meu desejo fez de mim um verdugo.
Sei que uma criança não cabe em um homem.
Sei o quê meu redor espera de mim,
mesmo que eu mesmo ainda não saiba.
Eu ainda grito,
choro
bato freneticamente os pés no chão
quando fico sem o pacote de doces.
Depois faço uma cabana no quarto com o cobertor,
ou durmo embaixo da cama,
lambendo as feridas que a fantasia fez, em mim,
virar dor.
E isso tudo só porque, agora que cresci,
meu doce é teu amor.

Então me rendo.
Entrego os pontos.
Fico nu neste sol de 40 graus que vai fritar minha pele.
Pouco me importa porque só sinto a partir da pele.
Dentro já não sinto, contemplo.

Meus joelhos estão no chão.
Meu rei sangrando no tabuleiro,
contente com a possibilidade de transcender ao calor da morte
e deixar para trás tantas obrigações sufocantemetne quadriculadas em preto e branco.
É a precisão que nos mata!

Mas quando, entre nós, faço uma medição,
chego a cogitar mesmo que estupro tua alma.
E revido meu próprio pensamento
pensando que o foco de luz que traço em teu caminho
é de uma lanterna dos deuses.
Isso justifica meu intento?
E do alto dos terrenos que piso,
ecoo teu nome pelo vale para que venhas
e sintas o cheiro dessas flores que não nascem na Terra.

Se isso em tua carne se faz dor,
é porque é na dor que a carne entende.

Tua confusão nem confusa consegue ser,
e em ti existe esse lúcido pressentimento.
Dance e brinque e minta.
Minta também a mim, que sei tuas verdades.
Minta sempre, mas só da pele para fora, sentindo dentro a verdade.
Nós somos de verdade, com todo o medo que a verdade nos causa.
Tua mentirinha é para mim uma carta de amor,
com letras de convite de casamento.

E à noite, que sempre revela verdades no escuro,
vamos brindar nosso amor com nossos corpos de pluma,
com nosso vinho veneno que já não contamina nossa carne que,
amando de verdade,
pensa que sonha alguma realidade.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

PRE(S)SENTE




Quando ela chegou no meu apartamento com todas as malas que traziam todas as bugigangas dela, compreendi que o que tínhamos tinha acabado. Mas como as percepções são sempre matéria a se confirmar com o passo das horas do futuro, ainda não tínhamos acabado DE VEZ. Viveríamos juntos: mesma cama todos os dias, mesmo banheiro pra escovar os dentes e cagar, espaços iguais e vontades diferentes, andróginos em busca da necessidade de não ser, sexo burocrático por amor, medo e tesão. Faríamos essas coisas de casal que mora junto sem ter filhos. O filme do que viria passou e entendi que antes de começar tudo já estava errado. Ela não devia morar no espaço que era meu porque era meu e não nosso. E como as coisas sempre chegam em momentos decisivos, tudo estava acabado.

Antes mesmo que ela fosse já sabíamos por pressentimento, mas não queríamos admitir. Por isso criamos uns personagens que se amavam, enquanto nos escondíamos atrás desses fantoches de pano vivo. A gente se sentia mal porque no submundo das nossas almas habitava um monstro chamado fracasso. Todo projeto que dá errado desce rasgando a garganta e fica embolorado no estômago. Um fracasso que empunhava a bandeira: “você não é capaz de, sequer, planejar a própria vida seu animal estúpido”. Além disso, tinha todo aquele amargo de saber antecipadamente que se viéssemos a viver juntos, permaneceríamos juntos por conta das contas.

Claro, as contas ficam mais curtas se são divididas em 2. 1 casa dividida por 2 é = à despesa de meia casa para cada 1, enquanto 2 casas divididas por 2 é = à despesa de 1 casa para cada 1, logo, esse é um dos dois momentos em que o amor tem alguma precisão. O outro é quando amamos de verdade. A merda é que esses amores em que paira uma dúvida eterna são como os gatos traiçoeiros que um dia inesperadamente lanham todo nosso rosto. Hoje em dia existem muitos companheiros de teto que já se amaram e continuam morando na mesma casa porque a grana é curta. Acho essa uma das grandes merdas de nosso tempo.

Eu tinha sido um apaixonado. Um apaixonado pelos castelos que havíamos construído quando os castelos ainda eram um sonho. Eu gostava do jeito do nosso amor e isso é e sempre será inexplicável. Cada amor tem seus jeitos, suas manhas, seus modos idiotas de falar e de fazer preliminares. Seus programas prediletos, suas melhores posições, seus melhores movimentos invisíveis. À parte isso - que é quase comum -, tínhamos o tempero da distância. Esse era O PONTO. Eu morava no sul, ela morava no norte. Havia um gozo antes de cada encontro. O “estar indo”, essa grande e arrastada preliminar, realmente nos excitava. Cada vez era uma outra vez, que se desenhava sempre como um novo encontro escondido. Tomávamos uns capuccinos pela cidade, depois da expectativa do portão de desembarque. Novidades em cada papo e às vezes até um novo perfume no cangote, que quando se misturava com o antigo cheiro da pele fazia tudo ficar perfeito.

Nosso amor tinha uma teoria, uma autopesquisa, várias conclusões desconexas. E pensando, o que as pessoas amam são sempre os conceitos. A distância era o conceito nosso, nosso chantily. Quando os sete mares para atravessar se transformassem em sete centímetros de lençol, tudo estaria acabado, afinal, só amávamos o conceito, materializado na distância entre nós. O único jeito de manter vivo o amor que tínhamos era sentindo aquele pedaço de ausência que sempre nos atormenta, como disse a Camile Claudell num dvd bacana do Chico. Não tinha jeito. Não tinha jeito porque é só no presente que estão as respostas. Quando ela chegou no meu apartamento com todas as malas que traziam todas as bugigangas dela, compreendi que o que tínhamos tinha acabado.



terça-feira, 3 de maio de 2011

Leitura recomendada - Andréia Beheregaray


A amiga e escritora Andréia Beheregaray lançou recentemente dois livros sobre as profundezas do universo-mulher, tão conhecedora que é dos abismos delicados do feminino em que homens e mulheres caem e se espatifam num duro chão rochoso. 

Esse vasto universo feminino, em que os homens sucumbem à maciez das pererecas e as mulheres acabam traídas pela própria instabilidade hormonal e existencial, sempre aparecem de forma ácida, doce e reveladora nos escritos da Andréia. Leitura recomendada.

Entrelinhas - José Saramago

domingo, 1 de maio de 2011

patologênese




Os sinais estão aí. Basta alguma atenção acurada e intencional para perceber que a racionalidade pede socorro. A racionalidade e seus títeres, que são os homens e as mulheres. A racionalidade é uma complexa assediadora de consciências pueris (e são tantas...), de consciências que não nasceram há dez mil anos atrás como Raulzito.

Essa espécie de Queda no Éden da sociedade contemporânea é um efeito natural como já nos alertou Capra no seu Ponto de Mutação. Mesmo sendo natural, tem resultados nefastos. Como se a saúde de um corpo inteiro dependesse da amputação de alguma parte esclerosada. As amputações invisíveis estão por aí e pode que alguém perto de você esteja com dores atrozes ou mesmo anestesiado com algum antidepressivo. A existência vem naturalmente dispensando esse exército de “portadores rígidos da verdade”.

O caráter natural não aproxima nem exclui os falaciosos atributos de “bondade” e “maldade”. A ruína – pessoal e coletiva – é uma condição de possibilidade da grande natureza cósmica que, em essência, não se pretende boa ou má. O maniqueísmo é uma amarra da natureza humana que nunca encontrou harmonia com o caráter transcendente da natureza cósmica, mas que se manteve até hoje como uma espécie de agente regulador dos trópicos da existência temporal. Assim como algumas partes de nós são descartáveis, também o são os princípios que afiançam a realidade de algum tempo, considerando toda a história como uma grande existência una.

Às consciências de hoje resta perceber que a natureza pessoal depende do seu próprio entorno e que, em havendo dissonâncias, qualquer possibilidade sadia de pertencimento será aniquilada. A não adaptação à nova frequencia que vem se instalando neste pedaço de tempo e espaço em que vivemos, promoverá alguma espécie de eco inaudível daqueles que permanecerem escravos de sua própria noção de tradição. A tradição neste tempo é uma traidora. Não é possível que haja unidade com alheamento e, por isso, permanecer com os vícios ortodoxos do maniqueísmo é carimbar o próprio passaporte para o não-pertencimento existencial nesse tempo que vem.

Se você é do tipo que tem mais certezas do que dúvidas... cuidado! Os castelos de certezas traem os racionais de hoje assim como os contos de fada traem qualquer menina-mulher que acaba percebendo que seu príncipe-grande-amor tem uma barriga imensa, peida embaixo das cobertas e ainda por cima é assíduo freqüentador da zona, só pra comer umas pererecas que tenham gemidos diferentes. Um príncipe muito mais ogro do que encantado. Deviam ter contado a verdade desde o início, tanto às menininhas-projetos-de-princesa quanto aos racionais, que têm finas paredes de concreto que sustentam uma grande massa chorosa e gelatinosa. Mas como poderiam ter aprendido sem que ninguém os tenha ensinado? E como agora, depois que suas próprias certezas se tornaram firmes como a rocha, poderá ser diluído esse edifício altaneiro de verdades? Essa construção que ameaça cair sobre a cabeça dos engenheiros que confiaram tanto na precisão de seus dados e esqueceram-se da natural espontaneidade dos terremotos... Haverá – que me digam os deuses – outra via que não aquela que nos faz beber a lama do inferno para que se possa indicar a saída a esses tantos? Ou manteremos a verdade de Nietzsche que já sabia há quase 200 anos atrás que no trono da grande sabedoria repousa absoluto o Diabo como grande mestre?

O óbvio é uma ovelha branca igual à outras milhares de ovelhas brancas do rebanho. A terceira guerra mundial não será do Bin Laden, nem do Kadafi, nem do Obama. A terceira guerra é na verdade a primeira das guerras da invisibilidade. Que pouca atenção temos dado ao silêncio e ao escuro, como se fossem partes mortas e inertes da nossa parte humana que só vê sentido nas cores e sons do utilitarismo.

Nessa inexorável caravela que leva os racionais ao abismo, não serão bastantes as ciências tradicionais. Os antidepressivos serão tão ineficazes como usar aspirina como método contraceptivo. A terceira guerra é uma guerra personalíssima: você contra você mesmo. Uma guerra sélfica, só pra se dar os devidos ares de importância pra esse negócio que é sério, inevitável e desafiador para quem pretende servir de bóia de salvação para os outros. A interiorização nos seus mais plurais matizes é o anestésico possível. A interiorização requerida vai desde o canal afetivo que se pode estabelecer com um bicho de estimação até grandes descobertas no terreno da espiritualidade. Vale ir à missa, praticar yôga, frequentar o psicólogo, meditar sobre si mesmo tomando um porre, estudar filosofia e usar a interrogação como enfeite do chapéu, significar a vida com o afeto puro dos filhos, dialogar com os próprios demônios, encontrar um amor profundo que permita um passeio comprometido em territórios selvagens do ser etc. Vale reiki, biodança, tarôt francês, aprender a tocar um instrumento musical e mais uma etc (acho a coisa mais idiota do mundo esse tal de etc.). Além disso, primordial é que cada um encontre o seu próprio meio de alinhar as ondas pessoais com as novas que já estão começando a enlouquecer muita gente por aí.

Os acometidos de overdose de racionalismo estão adoecendo, incapazes de suportar a nova frequência desta temporalidade e deste espaço histórico. Esses ainda viciados pelas fragmentadas linearidades da lógica padecem vagarosamente, já que a única linha reta que lhes resta é a que os conduz, como gado ao abate, em direção ao próprio abismo. Os significantes desses doentes da vez serão a própria causa do abalo sísmico em suas harmonias existenciais. Quantas vezes esses livros insuportáveis de autoajuda já não disseram que viver com um único norte na vida é cavar a própria cova? Esses livros são um porre, mas insistem em obviedades que se escondem no meio do rebanho de ovelhas brancas. Que paradoxo filho da puta esse de que o
óbvio vive em permanente estado de ocultamento...

Erga as armas e caminhe, SEM dentes cerrados e SEM sangue nos olhos porque isso é coisa desatualizada, em direção à seus territórios desconhecidos. Só assim será possível evitar a morte por exaustão (e dor de cabeça e depressão e ansiedade e pressão alta e TPM e úlcera e câncer e esquizofrenia e AVC e e e e...) no seu próprio labirinto escuro.