sexta-feira, 31 de maio de 2013

Vinho Filosófico em BC


das plenitudes



Continuarei abrindo a porta do inferno para o exército divino.
Continuarei abrindo a porta do céu para os demônios.
Meus chifres imanentes dividem harmonicamente o espaço com a aureola etérea da minha cabeça.
Estou no porto. 
Recebendo todos os barcos, com todos os tipos de gente.
Estou sentado na carteira de colégio improvisada ao relento,
preenchendo os formulários deste ensaio de humanidade para gentes ainda desumanas.
Minha vida e minha obra são incompletas,
e sonho que seja assim até que eu viva para sempre.
Mas minha vida e minha obra são circulares.
Retornáveis como litros de vidro de uma Coca-Cola antiga.

Sonho ser capaz de respirar todas as altitudes de todos os degraus da escada.
E sonho, em cada degrau, observar todos os 360 graus.

domingo, 19 de maio de 2013

deixar que os gatos caguem no tapete dos outros






Os cotonetes acabaram.
Então você compra um pacote de cotonetes na farmácia da esquina e logo resolve aquele desejo insano de USAR o cotonete.
Como uma síndrome de abstinência, você sofre uma overdose, 
e FINCA o cotonete com TUDO no ouvido.
Aquela nata podre se agarra no algodãozinho como o delírio de um gol.
Mas logo o ouvido direito fica entupido. 
Então você não escuta NADA com o ouvido direito.
Mas tudo que acontece no COSMO tem que acontecer, então você pensa que aquilo (1) pode ser um sinal para que você "se escute" mais, ou que (2) o espírito de uma velha surda acoplou em você sendo o efeito do cotonete apenas um pretexto, ou que (3) Deus mandou um recado no sentido de que é preciso ouvir menos e falar mais.
Mesmo morando sozinho e parcialmente surdo, você resolve fazer um jantar.
Corta a cebola e mistura à ela uma carne moída meio estragada.
Frita tudo até que a massa fique cozida na outra panela.
Enquanto isso entorna 2 taças de vinho.
Depois de pronto você escorre a massa.
Coloca a massa no prato.
Depois coloca aquele projeto de molho por cima da massa.
Em seguida o queijo ralado.
Depois que você consegue passar protetor solar nas costas e fazer uma janta, casar se torna prescindível.
Então você calibra a taça de novo.
E vai para a sala, jantar sem nenhum ritual, sem filhos correndo pela casa, sem gatos cagando no tapete, em paz com a sua televisão cheia de canais.
Mas ai a massa toda escorrega do prato e morre no tapete da sala.
No prato o molho estava por cima da massa, mas agora, no tapete, está por baixo da massa.
Ainda faltam dois dias para que a Carmen apareça pra faxinar o apartamento e manchar algumas roupas.
Você é um semi surdo e sem comida.
E isso não é um problema, afinal, a taça está em pé, equilibrada, firme, livre, democrática.

romina






O tempo para o amor é um destempo.
A tampa para uma panela que não tampa.
Amor pra mim é amor próprio:
é um arroz cozendo numa panela com a tampa entreaberta, pra deixar o vapor do processo sair.
Em fogo lento.
Pro tempo aprender a ter calma.

mínimas (porque as máximas são muito arrogantes)






Nada de novo no front. No mundo todos seguem felizes. Mas ser feliz não basta. É preciso ser mais feliz que os outros felizes. Desconfio dos felizes de vitrine. Eles são manequins. Mas são diferentes dos tradicionais porque vão ao mercado, levam os filhos na escola e até transam. Essa casta dos que são mais "felizes" a partir do ciuminho que os outros "felizes" sentem, é imensa. E vai acabar dominando o mundo. O Cérebro - aquele do desenho - nunca conseguiu dominar o mundo porque o exército do Pink sempre foi e será muito mais numeroso. Eles ganham no grito, ganham no abafa. Mas nunca deixarão de ser manequins que, quando pelados, tem uma cor pálida bege horrorosa. E aquele rosto perfilado com um trejeito nada pessoal. E aqueles genitais duvidosos.

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Não me interesso por lágrimas que escorrem sobre a maquiagem de um rosto.

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Sigo sem nenhum interesse pelos rebeldes e pelo governo da Síria.

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STATUS: Completamente arrependido de não ter estraçalhado e trucidado o pano da tua blusa, o cadeado daquele sutiã, o botão da tua calça. Juro que me arrependo. Juro com essa honestidade selvagem que Deus me deu.

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Fim de tarde no sábado é quando a paz ejacula.

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Pergunte a alguém: você voltaria a ter 5 anos a menos de vida? Todos dirão não. É a prova de que os pré-socráticos estavam certos. Jurar amor eterno é uma ficção - e quanta dor nas almas de arrogância metafísica causa essa ilusão. É assim que o verbo "estar" força a extinção do verbo "ser". É o "está" comendo o cú do "é"... e sem cuspe.

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O casamento e os policiais fardados são as duas únicas coisas oficiais que as mulheres gostam. De resto, preferem os amantes, as terças-feiras de noite e outras coisas supreendentes.

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É o ego meu Deus! é Ego o nome do diabo.

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É esta a sensação de uma tristeza: de uma chuva que nunca para.

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Cura é quando o vinho medica a doença.

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CONTEMPORÂNEAS: Síndrome do estrangeiro é não entender postagens com especulações sobre os dramas da novela das 8.

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DA SÉRIE - MULHERES IMPOSSÍVEIS (DE SUPORTAR)

1 - Ela é gente boa, mas vai em Bistrô.
2 - Ela é bonita, mas não lê Bukowski.


petúnia negra




2 - DA DESINTEGRAÇÃO 

Depois da rua e da esquina da rua, todos estavam sentados na mesa, dizendo suas retidões, cultuando suas nostalgias, fazendo ode a todas as fronteiras que existem dentro e fora do mundo, a todas as fronteiras que é preciso criar para dizer qualquer coisa. 

Todos estavam ali, vidrados em coisa nenhuma, chamando de "aspectos" o que, no fundo no fundo, era só uma parcimônia que encobria egos cheios de agulhas afiadas em direção ao mundo. Todos estavam lá, elogiando a verdade, mesmo sem saber a história da verdade. Justamente eles, que não sabem verdades tão pequeninhas como a sensibilidade que os cachorros têm em relação ao medo humano, ou a verdade dos torvelinhos do sonho, ou ainda o fato de que a verdade é uma cigana que, além de não ter residência fixa, joga cartas que aparecem sempre com diferentes composições.

Depois da rua e da esquina da mesma rua, as mulheres ainda esperavam na sala até que seus homens bêbados de vinho terminassem suas conversas sérias na biblioteca que não tem nenhum livro. E elas esperariam seus homens sérios porque homens sérios, quando se juntam, falam de negócios. E não há nada mais excitante pra uma mulher que homem "negando-o-ócio". Elas esperariam ali, resignadas, até a hora que fosse, cheias de amor por seus homens de negócios, que usavam gravata de dia e chinelos de noite pra que os pés brancos e sem vida pudessem tomar o sol da noite... como fazem os encarcerados com as migalhas do sol do dia. 

E elas também tirariam os pratos, assistiriam suas novelas, falariam suas banalidades, que eram as mesmas banalidades de seus homens de negócios sentados na biblioteca sem livros. Enquanto os homens de negócios transcendiam a altura de uns centímetros, elas lamentariam alguma dor, fariam alguma queixa velada, ririam por educação. Perguntariam alguma idiotice por aparência. 

Então os homens de negócios abririam mais uma garrafa, porque sempre é preciso estar bêbado de noite pra suportar a honraria de ser, durante o dia, um homem de negócios. O sonho do homem é a verdade de Sileno: ser nada. 

E suas mulheres, que não bebem tanto vinho tinto porque são melhores de tino, continuariam ali, querendo que aquele circo acabasse. As mulheres dos homens de negócios estavam fora deles e, por isso, a eles tudo parecia ter sentido. E eu estava lá, sentado com os homens de negócios, era um deles, era todos eles, mesmo não sendo nada daquilo nem de qualquer coisa. Eu participava daquilo como se participasse da vida. Articulando conversas e interesses. Participando de tudo, sendo tudo aquilo que um dos meus olhos de mulher testemunhava. Minha mulher era uma rebelde, uma desprendida. E quando vi, ela queria, como as mulheres dos homens de negócios, ir embora. E  vagava sutil, louca e lúcida pelo lugar.