sábado, 30 de julho de 2011

Mensagem do Sossego




[...] Mas ergo a cabeça para o céu azul alheio, exponho a face ao vento inconscientemente fresco, baixo as pálpebras depois de ter visto, esqueço a face depois de ter sentido. Não fico melhor, mas fico diferente. Ver-me liberta de mim. Quase sorrio, não porque me compreenda, mas porque, tendo-me tornado outro, me deixei de poder compreender. No alto do céu, como um nada visível, uma nuvem pequeníssima é um esquecimento branco do universo inteiro.  


Fernando Pessoa

quarta-feira, 27 de julho de 2011

AMY E OUTRAS OVERDOSES

Amy na sua fase mais saudável...
Sábado passado fui avisado de que a Amy morreria mas não consegui entender o recado. Viva ou morta a Amy deixou uma interrogação moral difícil de compreender. Além da voz demoniacamente bela, era o pacto que ela tinha com Dionísio o que mais agradava os fãs.

Ser, ao mesmo tempo, genial e suicida é uma conjunção existencial de atributos que a moral não coloca no mesmo saco (ou não gosta de colocar...). É como se toda a genialidade tivesse a obrigação de se eternizar igual à Jesus na cruz e, ainda, como se, por outro lado, todo o suicídio devesse ser levado à cabo por alguém sem qualquer atributo nobríssimo e cultuado pelas massas.

A Amy fez e ainda continuará fazendo a “filosofia das certezas” esmorecer diante de tamanha incompatibilidade de atributos, ou seja, explico, é quase impossível que seus dons demoníacos e divinos saiam ilesos ao entrar no universo dos julgamentos morais. É o mesmo estranhamento que a moralidade tem quando não consegue compreender como um milionário resolve abrir mão de todas as cifras e virar um mendigo de verdade, ou ainda, se o mesmo milionário resolvesse mandar tudo à merda e ir meditar com os monges no Tibet, pensando que é só a kundalini a grande riqueza do ser humano.

Ver que ela (a Amy) roda-a-cotia-de-noite-e-de-dia com tanto álcool e drogas é um colírio aos olhos do público, que em geral tende a achar que todo grande artista tem direito a acabar com a própria raça pra produzir seus frutos legítimos, ainda mais se tiverem qualidade. O Diabo é mais irmão da Arte do que Deus, não há dúvida. A arte carece de intensidade, de uma brincadeira irresponsável no limite do desfiladeiro. Deus nos dá plenitude e não intensidade. A arte divina não tem cor justamente porque, em se tratando de Deus, tudo é luz e não cor... A Amy, claro, bebia com os anjos troposféricos e, por isso, à distância, o comentário entre todos era: “Nossa, ela é LoKoNa”...”Uhuul”... (...mais reticências...) ... ... ... ...

De longe, a loucura suicida da Amy pode ser perdoada, afinal, por mais bêbada, inconsciente, inconsequente, chapada, irresponsável, pá-virada ou desleixada que ela tenha sido, o cd continuava e continua tocando sempre igual, mecanicamente, obediente às ordens do seu dono que determina o momento de dar o “play”, o “stop” e o “pause”, este último caso toque o telefone e seja hora da Amy calar a boca pra não atrapalhar a ligação.

Entretanto, a reação do público que ia aos shows da Amy confirma que nosso inconsciente coletivo não sabe lidar com a rejeição, confirmando em grande parte os prenúncios da psicanálise, que percebeu que nascemos em meio a muito sangue e muitos nãos...nãos estes que tem como NÃO-MOR o de que NÃO podemos permanecer no útero. Quando nascemos, é como se a enfermeira mostrasse uma placa imensa com a inscrição: “NÃO, VOCÊ TERÁ QUE FICAR FORA DESSA BANHEIRINHA DE ÁGUA QUENTE, TERÁ QUE FABRICAR O PRÓPRIO ALIMENTO E SE FERRAR BASTANTE PRA APRENDER AS COISAS”.

Isso porque, ao vivo e para os que só admiram e admitem um caos controlável, a Amy é intragável. Afinal, que história é essa de não cumprir com o prometido, já que os ingressos do show foram pagos, e vocês tem o D-I-R-E-I-T-O (todo detentor de direitos fala a palavra com um vagar nojento...)de assistir o showzinho com os amiguinhos ou com a namoradinha, né suas criançolas de merda? Nos shows, em que a Amy continuava sendo o que era de verdade, ou seja, uma drogada que canta muito bem (mas que canta só quando quer), os sumiços do palco, os tombos e as golfadas de vinho goela abaixo eram chocantes para o público que queria e ter a certeza de que estava pagando para ter atendidos os seus desejos de prazer e pertencimento. A Amy estava se lixando pro público, não fazia de conta que amava todas as cidades em que cantava, não participava da hipocrisia de merda...e, pensando assim, pode ser que tenham requisitado ela pra dar aulas de honestidade individual no reino dos céus...

Os gênios não se importam com os contratos. A Amy tava "nem aí" pro contrato com a gravadora, pro empresário da cidade que contratou o show, pra todos os seus fãs de mentirinha que aceitavam o néctar mas repudiavam o cheiro ácido do vômito, que vaiavam e vão continuar vaiando, porque querem controlar a incontrolável terra do nunca que existe em cada ser humano. Nessa overdose invisível e coletiva, ninguém desmaia em cima do palco. Os vômitos são privados. A morte, anunciada.  

segunda-feira, 25 de julho de 2011

O MURO DE ESTAR






Tenho sido um concordante, e é fácil:
basta ficar em cima do muro.
Ficar sempre em trânsito,
vivendo num gerúndio eterno.
O alto dos muros é pra quem flerta com o equilíbrio.
É pra olhar melhor,
pra usar a politicagem,
pra ter argumento a favor de tudo.
Não é uma forma de defesa porque o único risco é o de que nasça algum.

Então eu guerreio meio sorrindo,
como se o jogo da vida fizesse uma pausa pro mijo,
ou desse uma espreguiçada na coluna como fazem os gatos.

Paro de limar a ponta da lança -  e até a esqueço.
Reinvento a utilidade do que é só objeto.
- E será que nós também não? -
E da lança, agora transviada em adereço,
faço cabide de segurar minhas toalhas enxarcadas de bênçãos,
como se eu cagasse apaziguado num lavabo chic, aberto sobre o universo.

Faço batuque no que antes servia de escudo,
pandeirando esse nada que é a vida,
vendo o sobe-desce do sol, em cima do muro,
sem entender nada,
mas sentindo QUASE TUDO que é possível.

sábado, 23 de julho de 2011

LIMPANDO O FÍGADO


campeão mundial em limpeza de fígado


Estavam no meio de uma festa de rock, sabiam que rir era o único exercício capaz de limpar o fígado. Começaram a dar uma gargalhada inventada, mas rir de verdade, como se fosse de verdade, uma cena perfeita, apenas pra limpar o fígado. As pessoas ao redor ficaram curiosas quando um deles começou a rolar no chão de tanto rir. Uma se aproximou e perguntou:

- Porquê vocês estão rindo?

Um deles respondeu:

- Só estamos limpando o fígado...

Um deles caiu por cima de uma mesa, quebrou copos, e só não tomou um sopapo porque o homem achou que não valia a pena arrumar confusão com um bêbado. O segundo também acabou rolando no chão de tanto dar risada.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

CONFESSO QUE TENTEI



Já tentei de todos os tipos, idades, tamanhos, cheiros, cabelos, currículos, tons de batom, gostos musicais e gastronômicos. Já tentei com a engraçadinha que trepava mais ou menos e que tinha ares de ser uma futura boa mãe. Tentei a burrinha altamente gostosa que apesar de me segurar por um tempo, acabou se tornando insuportável. Com essas não tem jeito meu amigo, ou você bebe bastante pra apagar depois do sexo, ou apaga depois do sexo fingindo que apagou por outro motivo ou, ainda, tenta passar todo o tempo com o pau enterrado naquela pererequinha linda e oca como a dona.

Tentei as diferentes ao extremo, as hippies, as marxistas com camiseta do Laranja Mecânica e all-star desbotado, as yôgins, as que tomam chá de cogumelo, as que fumam maconha o dia inteiro pra viver além da linha do tempo-espaço. Com as religiosas tentei apenas por cogitação, pensando que minha vida poderia ser calma se desse certo com uma dessas que gozam legitimamente quando dizem “AI MEU DEUS”. Com essas só cogitei porque estou mais pro lado do inferno mesmo, não tem jeito.

Tentei via internet e via intercâmbio. Pela internet tive uma namoradinha virtual que mentia que ia mostrar TUDO pela web cam... descobri que mulher odeia web cam (se alguma quiser explicar o real motivo, manifeste-se por favor). Ela acabou mostrando, num diazinho apenas, uns nacos da bunda que parecia uma saúva preciosa. Terminamos o namoro virtual no dia em que nos conhecemos pessoalmente.

Tentei as de outros estados da federação, pensando que a cultura podia ser um atributo salvador. A distância ferrou com tudo. Tentei as de outros países pensando que seria bacana largar tudo pra viver um grande amor no estrangeiro (eu era novo demais, idiota demais, vi filmes demais... e daí a gente se engana achando que a vida é um filme). Tentei comer as amigas, ter relações mais verdadeiras em que a amizade pudesse ser a cereja do bolo. Nosso projeto de manutenção das TRANSUAIS (transas casuais) não foi além da primeira.

Tentei as com mais e menos idade que eu. As casadas e as solteiras. Viúvas  não cheguei a tentar e, pensando, pode ser uma boa, desde que o defunto não venha encher meu saco de noite. Tentei querer inventar amor onde amor não havia, sem poder explicar como aquela mulher tão legal podia não ter me interessado, caído nas minhas graças tão cheias de exigências e bipolaridades orto e heterodoxas (ao mesmo tempo).

Tentei esquecer amores verdadeiros. Tentei entender os amores verdadeiros... esse pode ter sido um erro fatal. Tentei as putas que não cobram. Essas são divertidíssimas, mas também têm o mesmo problema de ficar só tentando como eu: tentando consumir imediatamente algo que sempre está cru demais, tentando enganar o próprio ego, tentando descartar a profundidade do amor. Tentei as putas que cobram – e foi um dinheiro bem gasto. Uma se apaixonou por mim e acabou se tornando uma grande amiga, as outras foram boas e más porque até nesse serviço existem critérios de qualidade. Não existe relação de homem e mulher mais sincera do que as com as putas, é tudo muito claro, frio, burocrático, animal, contratual e honesto.

Tentei mulheres para que eu pudesse atuar como professor. Tentei outras em que eu me sentia aluno. Tentei cruzar o oceano e levar alianças, infelizmente acho que isso se faz apenas uma vez na vida: se der certo é porque deu certo e, portanto, irrepetível; se não der, é improvável que se faça de novo. As frustrações nos fazem desacreditar e desacreditar é perder a possibilidade de viver plenamente. Tentei ganhar umas com poesia, outras sem poesia, outras com indiferença vigiada. Sobre o efeito da indiferença, detectei que o ser humano é ainda muito viciável por todos os tipos de dor. Somos efetivamente como o girassol poetado pelo Pessoa: não cremos na verdade que está diante de nossos pés, senão no inatingível calor do sol, com seus ares de infinitude e eternidade. A insatisfação humana impede a realização do amor, o que é lastimável e nos dá uma pena danada pelo fato de estarmos tão humanos desde sempre.

Mandei flores soltas e em ramalhete. Espalhei pétalas na cama para as poucas que amei de verdade. Cartões foram escritos e energias foram enviadas pelos ares. Programei encontros que funcionaram e outros absolutamente desastrados. Tentei mentir e isso é uma merda porque pagamos todas as contas AQUI MESMO. Fiquei esperando 4 horas, de noite, no frio, em cima de uma árvore perto da casa de uma ex-namorada, só pra confirmar que ela já andava com a perereca assada de tanto dar pra outro cara (o cara que deixou ela em casa as 4 da manha quando a carne da minha bunda já tinha virado um guisado). Essa vez fiquei mal de verdade... e acho que o modo de condução e término do nosso primeiro namoro determina muita coisa no terreno da afetividade incessante. Óh afetividade, a grande vilã de todo mundo. Eu fui traído, corno mesmo, dos grandes. No meu primeiro namoro eu acreditava. Depois do corno acho que desacreditei. E hoje a guerra é pra voltar a acreditar, voltar a crer num sistema de ilusões que tenta congregar todas as minhas descrenças. Como se eu rogasse pela cegueira que me foi roubada por raios lancinantes de lucidez.

Fiz serenata de terno em cima do carro que ficou todo amassado, a mãe da guria gostou muito mais que ela que, àquelas alturas, já tava dando (com prazer) pra outro cara. Por tentar, eu sofro com as mulheres. Tentei as eruditas que eram ótimas pra um bate papo sobre Marx e Nietzsche, mas que sempre tinham um pixel fora do lugar ou um cheiro incompatível (a exigência é uma defesa sobre a nossa própria incapacidade de amar). Tentei as mais velhas, assumindo resquícios de um Édipo fajuto que ao fim nunca ganha a qualidade de ter só resquícios. Adivinha? Não deu certo. Tentei as novíssimas, tudo no lugar, silicones cheios de esperança e desejos de princesa; mas os poucos anos de vida (quase) fazem as pessoas parecerem iguais. Nesse caso sempre há muito que se caminhar e meu sedentarismo relacional nunca aguenta a potencial maratona a ser percorrida.

Tem uma época da vida do homem em que tentar tanto assim é um prêmio. Hoje sinto vergonha, confesso. Tentar pode ser uma forma de esperança persistente, mas nunca deixará de ser uma espécie de fracasso. Tentar nos embrutece, nos faz ganhar armas (só que armas pressupõem a existência de uma guerra...e as guerras, em se tratando de afeto, são absolutamente dispensáveis) e perdemos milhares de possibilidades de acreditar que os filmes podem existir na vida da gente. Acreditar que dá pra acreditar, sabe? É por isso que os olhos dos lobos amaldiçoados das histórias infantis é todo amarelado.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

MARAVILHOSO OU PERFEITO?





- Independentemente de rótulos, eu gosto de você, seja lá que nome a gente tenha, ou proximidade mantenha.
- Nosso encontro não tem nome mesmo, a única definição é: maravilhoso quando estamos juntos e perfeito quando estamos separados, vivendo nossas vidas cheias de nós... (nós mesmos e nós de marinheiro). O que será melhor, então? Maravilhoso ou perfeito?

domingo, 10 de julho de 2011

A CULPA DA CLASSE a

O quê a filosofia da moral moderna e o quê a filosofia da moral contemporânea diriam sobre o quadro “A vida Glamurosa da Classe C” do Pânico na TV?

A primeira filosofia não diria nada, porque na época da filosofia moderna (que resumindo achava que a RAZÃO era a bola da vez já que o Nosso Senhor Todo Poderoso da Igreja católica-apostólica-romana-amém tinha brochado e teve impedida a chance de tomar viagra porque naquela época a Pfizer não existia), sequer havia televisão. Ainda assim, tenho quase certeza de que os assuntos deviam ser muito parecidos na “rádio corredor” da época.

A música dos Titãs foi precisa quando disse que “a televisão me deixou burro, muito burro demais”...não porque não existam programas bons, eles existem, e o Pânico é um deles se você conseguir e entender que rir é uma forma de deixar de pensar e, portanto, viver bem. Não pensar é viver bem e é por isso que a meditação, a espiritualidade, as terapias, o yoga, a acunpuntura, o reiki, o I-ching, o taichichuan, o furgirokakombi, e todas essas coisas orientais estão se tornando personagens principais no “Pequenas Empresas, Grandes Negócios”. Escola de yoga no “Pequenas Empresas, Grandes Negócios” é um RETRATO da contemporaneidade... que será marcada, nos livros de sociologia desse nosso tempo, como um tempo de gente com dois grandes objetivos: ser rica e obter paz interior. Mesmo assim, até pra obter paz interior é preciso dinheiro, a não ser que você resolva o problema enchendo a cara com pinga barata, o quê acaba dando quase na mesma.

Quando ficamos muito tempo assistindo televisão, deixamos de pensar para sermos pensados. Ligamos a TV e nos desligamos. Somos pensados por quem define o conteúdo que será exposto na tela, pela associação contextual entre imagem e som. Isso hoje já não significa dizer que tudo que aparece na TV é liberal, burguês e individualista como todo intelectual gosta de pensar. A internet vem tomando o lugar da TV e esse vaticínio garante que a domesticação provocada pela TV se amenizará consideravelmente quando as pessoas estiverem capitaneando o clic e tiverem liberdade para estar em todos os lugares e acessar todos os temas e textos do mundo.

Na internet é possível escolher, ao mesmo tempo, as altezas das mais íntegras filosofias, minuciosas explicações científicas, outras profundezas explicadas por todos homens que já passaram por aqui e, por outro lado, as baixezas do bate-papo com algum ignorante igual ao outro ignorante que escreveu o primeiro “oi” “e aí” “tudo bem?” no msn. Com a televisão também dá pra escolher o Café Filosófico da TV Cultura em detrimento do Pânico na TV (que passam no mesmo horário), mas como quase ninguém fala do 1o por aí, a propaganda do Café Filosófico fica comprometida.

De todo modo, de nada adianta você ter o universo à disposição se dentro de você houver apenas um pequeno vilarejo e você não puder vencer as pressões sociais de estar em lugares e espaços que não são determinados por você...Quando a internet vencer a TV, grande parte dos intelectuais ficarão órfãos, terão que abandonar o argumento cansado de que a mídia é protetora das elites e terão que voltar a estudar (talvez as coisas orientais...). É compreensível que ainda façam isso como forma de compensar o histórico desequilíbrio de classes que ainda hoje permanece  vivo mas que já não é mais tão totalitário assim. 

A filosofia contemporânea olha para o programa que tenta causar riso a partir da vida da classe C, que acaba sendo classe C na roupa que usa, nas festas que vão e também no que se refere à capacidade de pensar, e pensa: qual a diferença entre a classe C e a classe A? E a resposta é rápida porque a diferença é que, enquanto a classe C come guizado de 3a, veste roupa de balaio e compra cd's do camelô; a classe A come filé mignon, veste as marcas que o mundo do norte ordena e esbanja potência tecnológica nos I-Phones e outras coisas do tipo. Além dessa diferença, existe outra, que acaba fodendo com a moral da classe A, sem que ao menos ela perceba que sua própria moral é abalada.

A classe C, por estar alheada das condições de possibildade de formação de qualquer pensamento crítico que supere o impulso de rebanho enfiado goela abaixo pela televisão e outros outdoors pósmodernos, não estuda nos colégios que prestam (aliás os colégios da classe C vivem em greve...) e, portanto, acabam - pobres pobres -  se tornando uma grande massa de medíocres... Mas se quisermos olhar para o outro canto da fila, na esperança de que a classe A sirva de contrapeso à mediocridade, acabamos frustrados. Mais que frustrados, indignados, porque a classe A consegue ser medíocre mesmo que tenha todos os acessos e possibildades. Na vila e nos condomínios de luxo a música sertaneja é moda. No morro e na beira-mar, os horizontes de sentido são os mesmos (e nem vale a pena elencá-los). E os colégios da classe A sequer entram em greve...A classe C se diverte por estar na TV. A classe A ri da classe C. Todos dão risada. Contentes. Contentamento raso é o que todos querem. E todos acabam no mesmo barco furado, afundando sem perceber. E, se fosse possível estabelecer graus de culpa entre as "classes" (porque efetivamente classes não existem), a maior culpa sem dúvida seria da última, que mesmo tendo estudado e feito terapia, continua passivelmente ignorante, deixando-se enrabar.

O Brasil ainda tem essa ferida chamada classissismo. As pessoas realmente acreditam que são diferentes (leia-se, melhores) das outras porque tiveram a sorte de nascer de pererecas cercadas por mais moedas de ouro. As pessoas realmente acreditam que vivem e são de nichos diferentes, com níveis diferentes...sem perceber que suas mediocridades são mais culpáveis porque tiveram condições de possibilidade melhores. A mediocridade destes fede muito mais.
....

sexta-feira, 8 de julho de 2011

AINDA PENSAMOS QUE O QUÊ PENSAMOS É SÓ PENSAMENTO...





Ela toda era uma menina,
senão os olhos, 
quase cansados de tanto já ter visto.
Olhava através dos vidros do ônibus, mas sem ver nada.
Também não enxergava nada.
(Já tentaram inventar diferenças sobre ver e enxergar.
Pura idiotice de poeta).

Fones no ouvido pra evitar conversas sem razão.
(Quando as pessoas percebem que têm outras tantas por dentro,
dialogar com os vizinhos de dentro é mais legal do que conversar sobre o clima com um estranho.
Se, por um lado,
dialogar com os próprios fantasmas nos eleva à condição de senhores da autocracia que inventamos,
por outro, ficamos agrilhoados perpetuamente por nossas próprias imcompreensões.
Incompreensões são prisões).

Ela tinha incompreensões próprias da geração Y e de alguém que pensa.
Por isso a intensidade da incompreensão dela era dobrada.
(É fácil de compreender a incompreensão porque
- sem muitos rodeios -
ela é uma falta de sentido em todas coisas ao nosso redor).

As dela eram interrogações flutuantes,
julgamentos,
condenações,
renascimentos em poucos segundos,
minidepressões,
microsalvações,
amores inseguros,
corpo inseguro,
desejos seguros,
retardos de um lado,
precocidades de outro,
iluminações que vinham de cima,
tufões de coisas que o corpo não podia aguentar
e que a alma não podia entender completamente.

Mas ela queria tudo muito completamente.
(Quando a vontade de completude é tanta,
acabamos, quando é possível ir longe, sendo só pela metade).
Gente assim não se contenta com nada que não seja inteiro,
ainda que esse possa ser o prato de comida do anjo e do demônio que sentam em nossos ombros. 

(Viver é um exercício de negação da própria natureza.
Nossa natureza flerta conosco nos 360 e tantos dias do ano.
Temos medo.
Queremos fugir do que é nosso e do que pensamos.
Em geral fazemos isso porque pensamos que o quê pensamos é só pensamento...
Ao fugir - e sempre sabemos de nossas fugas, não é meus caros cônscios? -
nos culpamos.
Nos culpamos porque cometemos a maior das traições: desacordos entre o quê sentimos, somos e pensamos.
Faz bem à saúde que essas coisas estejam de mãos dadas). 

Ela, com seus fones de ouvido, sentia-se culpada.
A culpa era, na verdade, do presente.
A culpa era do destino,
que calçou all-star pra caminhar em direção ao futuro.
Ela sabia de tudo porque duvidava de tudo.
E a calma da paz viria com as rugas.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

OS LÁBIOS DO COLDRE





Quero ser enganado.
Isso que busco.
Quero que me deixem confuso.
Indeciso.
Quero que me joguem num labirinto.
Quero ter que pensar.
Quero dar adeus à obviedade.
Sou um curioso.
É coisa de homem,
de homem infantilóide,
que quer ver todas as pererecas do mundo interagindo com suas donas.
Ser curioso é A característica do homem.
A hipocrisia, na sua etimologia, por certo,
deve ter nascido no dia em que o homem teve que começar a ser de uma mulher só.
Na antiguidade, era um bacanal desgraçado.
Os gregos comiam todo mundo,
davam a bunda, chupavam-se mutuamente,
e como não haviam os jornais,
nenhum jornal noticiava a notícia como escândalo.
No império romano, as mulheres eram orgulhosamente do lar,
não tinham os brios desassossegados
por não definirem as coisas fora do microcosmo da casa.
Lá, nas coisas da rua
os homens mandavam, e, nas de casa, elas.
As romanas entendiam que 1 é = a 1.
Ter pensado que a rua era mais importante que a casa,
fez das mulheres as promotoras da atual esquizofrenia do mundo.
E as mulheres sempre tiveram mais condições de perceber
que tanto a casa quanto a rua são imprescindíveis,
sem que uma seja necessariamente “melhor” que a outra.
Mas as esposas gregas eram submissas, o que era uma injustiça.
Aristóteles achava que as mulheres e os cachorros estavam em pé de igualdade.
Aristóteles foi idiota nesse ponto.

No século passado as mulheres foram libertas da masmorra.
Yes, she can! Yes, they can!
Sinal dos tempos melhores que vivemos.
Hoje estão com todo gás, gozando múltiplo, nos superando em muitas coisas.
Nós não gozamos múltiplo.
Esse brinde dos deuses é só da mulher e é merecido.
Na antiguidade as gregas gozavam enquanto as romanas faziam polenta.
Hoje as meninas de 18 não gozam...
enquanto as de 40 têm orgasmos múltiplos com as instruções da Revista Nova.
Seja como for,
os homens de 18 e 40 só são diferentes pela cor do cartão de crédito.
Aprendi com as mulheres que as mulheres observam a cor do cartão de crédito que usamos.
Quanto menos colorido, melhor, o que ainda é um resquício da modernidade.
Claro que não todas as mulheres antes que me apedrejem.
As mulheres são melhores que os homens, é preciso que se admita, eu admito.
Estão mais na moda, e cada vez mais estarão.
Mas hoje não há mais submissão.
Hoje vivemos no momento da história
que registra o maior número de homens mandados e comandados
pelas namoradas, noivas, esposas, amigas...
As pererecas têm um poder infalível
e todo homem vive de tentar ficar livre da maldição de alguma,
ainda que seja quase inevitável,
tarefa dos mestres budistas que moram nas cavernas da Índia -
que não faz churrasco no domingo porque todo mundo diz amém na frente das vacas.

Esse momento da história causa este problema:
as mulheres deixaram de ser mulheres por que aprenderam a não ser submissas.
Nisso existe uma incompreensão feminina que as gerações futuras vão perceber.
Existe uma teimosia feminina. Um desejo de levar um 38 no coldre.
Cansei de escrever.
Não sei se é o assunto ou o horário que me cansa ou se eu talvez queira promover um autoengano.
.........





domingo, 3 de julho de 2011

EU SOU ROMÂNTICO






- vou mandar um vídeo pra você amor, dá uma olhada nessas 2 gostosas sendo comidas por esse cara, me diz amor, me diz se você acha que elas são gostosas como você...?

(tempo depois)

- e aí amor, o que achou do vídeo?
- ai, sei lá...to ouvindo essa música no youtube, olha.

Uma música choramingando algum amor começou a tocar.

sábado, 2 de julho de 2011

SOU O CAMÊLO




A eternidade não tem muita fome. Ela come pouco. Se alimenta de farelos esporádicos dos raros instantes mágicos que temos na vida. A eternidade vive só do brilho distante das estrelas. O saco quase vazio da eternidade, consegue parar em pé, contrariando todas as avós do mundo. Se as estrelas se escondem, a eternidade espera sem ansiedade, afinal, ela sabe demais por ser eterna, e sabendo demais, sabe que os dias nublados terminam, sabe que a noite, quando vem, derrama a tinta da escuridão sobre o dia, fazendo dos pingos claros das estrelas, anúncios de que as saídas e as salvações existem, ainda que possam. as vezes, parecer distantes como aquelas estrelas que moram nuns lugares em que nem a Nasa consegue chegar, mas que nós podemos visitar nos sonhos se acreditarmos neles.

Como uma pílula da vida eterna, o instante mágico fica pregado no coração da gente, como um anúncio de entrada no portal dos nossos jardins diletos e deliciosos, jardins que podemos entrar a qualquer momento em que a parte doce da memória se deixe servir de chave. É intrigante perceber que enromidades se sustentam com tão pouco, com pózinhos invisíveis. Falo das amizades, dos amores e de tudo mais que se sinta com coração pulsando, sangue quente e imaginação guiada pela intuição. É que sinto tanto que até a amizade que sinto por essas formigas - que perambulam ao meu redor - é eterna. E elas são tão pequenas e tantas... assim como eu, e acabo identificado. Eu sou um camêlo. No meu deserto a água aparece no modo "chuvas de verão". Depois que abro a boca pra abocanhar uns pingos, tenho a alma lavada. Depois que a chuva para, torno-me Senhor de mim. Sei que na mesma carne em que posso ser Deus de mim, mora meu próprio verdugo. As chuvas de verão sempre param logo, fazendo o alívio recomeçar seu tormento. Sou um camêlo. Sou um camêlo até a próxima chuva efêmera de gotas mágicas nesse deserto que, tentando me matar, acabou se acostumando comigo.

o ser radical em Jung




“Deslocar o tema usual - este é o escândalo, a heresia; e é aí que Jung - arcaísta, patriarca, arqui-conservador - é radical no real sentido da palavra. Radical porque vai de volta aos radices, às raízes, os archai.”