quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Contos Imediatos VIII



CARNAVAL EN PASSANT


O carnaval era na avenida, como manda a história. E a avenida era dos desfiles de sempre. O quê muda todos os anos? No carnaval enredado das avenidas do mundo, passou a resignação, passou o desejo, passou o estupor, passou a raiva, passou a insônia...Passaram as certezas, a inventividade, os jogos silenciosos, o furor e a luxúria. Passou também o ódio, todo carnavalizado. A saudade passou fantasiada de piedade. O sonho passou acordado com olhos vermelhos de tão arregalados. Passou a tristeza vestida de branco, e o porvir vestido de flores. Passou a vingança com nariz de palhaço. A ternura passou em abanos, mas toda cabisbaixa. A angústia passou curiosa, procurando um telhado para a chuva que queria suspender o desfile. As novidades passaram como saltimbancos velhos e cheios de rugas, sequer podiam pular. Se arrastando frouxo na avenida, o rancor passou, ele que já vinha de outros carnavais. Passou a compreensão, que já não passaria mais. A alegria passou de maca, com as pernas dilaceradas: um bêbado sem rumo a havia atropelado noutra esquina. A compaixão passou meneando a cabeça. Outros passaram. Passou o arrepio, todo arrepiado. Passou o futuro, coberto de poeira. Passou a volúpia, a vertigem e as sensações; todas com ares de vilã. Passou o interesse, despreocupado. Passou a preocupação, toda desinteressada. Passou a indignidade, com um terno bem passado. Passaram ainda outros que não foram vistos. No carnaval as avenidas lotam, e não se pode saber quem é quem. O amor andava entre os foliões inconstantes, perdido. Também passou.
PFF

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