quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Orfandade


Uma indagaçao me caiu no colo do pensamento, lembrando da rusga histórica que Saramago, o escritor luso, tinha com a Igreja Católica e com os crentes em Deus de todas as polaridades. Pois que vão morrendo os Papas, os representantes de Deus nesse plano telúrico e, ato contínuo, a Igreja inventa um substituto, já envenenado de vontade de poder, com atributos para seguir a jornada de cristianização, que, diga-se, anda toda capenga com a propagação das religiões made in China e com a descoberta de que o impulso sexual dos padres não pode ser tão controlado assim como queria o Onipresente. E a ideia da Igreja segue. Capenga, mas segue. Com outro representante, mas segue.
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Mas quando morre um alguém sem instituição como o Saramago, alguém indefinido e com uma ideologia tão personalíssima que até se poderia erguer um templo para cultivo de seus postulados humanitários, como é que funciona? Onde estão aqueles que ficaram com sua procuração (e seu dom), para seguir remando e fazendo andar a nau da percepção? Dos gênios, sobra o rastro dos seus pensamentos nos escritos, a serem interpretados pelas gentes com nobres propósitos ou apenas com vontade de ler alguma coisa nas férias. Dos gênios como o Saramago parece que fica muito pouco do que ele representou quando podia fazer da inquietação alimento para outros inquietos.
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E o pensamento fidalgo morre - ou para não ser tão drástico, desmaia - nas estantes e nas bibliotecas. E vira centro turístico de gente que vai no futuro tirar foto em Lisboa sem sequer saber de quem se trata e do que tratava o indignado defunto. Isso porque a representatividade do gênio é coisa que se acaba com seu último suspiro. E da sua religião pensante fica o mundo órfão, tanto os que das suas genialidades já se haviam percebido quanto todo o resto que ainda levaria (levará) milenios para perceber. E até que brote de algum ventre abençoado um outro Saramago com outro nome, ficamos meio assim, sem pai nem mãe. Pássaros de boca aberta no ninho à espera de outra ave-mãe, que poderá nos alimentar com um colírio análogo para os olhos pensamento.

2 comentários:

  1. Assás oportuno essa reflexão. Devido a mesma, não pude deixar de lembrar-me das palavras de Mateus, que citando Jesus, escreveu: "O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais passarão" Mt. 24.35 Como você mesmo sabe, infelizmente tem-se cometido absurdos em "nome de Jesus", fazendo-o parecer um palhaço ou o Aladim dentro de seu "céu", bastando apenas esfregar e fazer um pedido que certamente se terá o que deseja. É por essas e outras que urge a grandiosa necessidade de se reformar a "igreja evangélica" atual, haja vista assim como nos tempos de Lutero (na época o catolicismo), o evangelicalismo de hoje está travestido de piedade e benignidade, mas em sua essência, habita o maligno.

    Certamente grandes mentes passaram e passarão por este mundo, mas há se de convir que as Sagradas Escrituras tem algo humanamente inexplicável, que a faz perpetuar gerações e atravessar abismos instransponíveis aos homens.

    Grande abraço.

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  2. Interessante ver essa observação que vem de alguém que está dentro do evangelicalismo de hoje, ou pelo menos de um braço dele. Concordo contigo Filipe sobre a necessidade de reforma, mas antes, é mais fácil entender que o outro não sou eu, e que pode, até mesmo sentir necessidade do maligno. Afinal, as razões são tantas...
    Obrigado pelos belos comentários.
    Abração

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