O filósofo Paulo Ghiraldelli, no texto Os Deuses do Brasil, fez uma importante reflexão sobre a ojeriza coletiva que se tem à crítica (o que estamos acostumados a chamar de crítica construtiva) e, também, à regrinha social de que, em nome do polimento e da boa educação, devemos nos omitir de apontar o equívoco, a burrice e a ignorância alheias.
O que – me parece – atravessa esse perfume superficial (o polimento) que tenta mascarar uma caganeira (o fato de que o burro estará condenado eternamente a ser burro, ainda que na maioria das vezes sejam burrices pontuais), é a dificuldade de acreditarmos na saúde que provém de uma boa relação com o Diabo. Repudiamos o Diabo porque não conseguimos ver a “divina” possibilidade de construção a partir do NÃO.
Eis o mote da dificuldade de absorver a crítica. Essa ideia já gasta da psicanálise, de que recalcamos a crítica por não termos suporte de carregá-la, afastando de nós mesmos nossos aspectos sombrios e nossas diabruras, é o que está no cerne do péssimo tratamento que se dá à crítica.
Entre os leigos é comum a ignorância sobre o fato de que a crítica é, antes de tudo, uma análise. Uma análise que nem sempre está preocupada em buscar um posicionamento. A crítica, vista como o julgamento que outro faz de algo que é meu, não é crítica, mas luta entre egos inflacionados. O senso comum combate o espaço transitório que é o famoso “em cima do muro”. Porque o senso comum odeia gente em cima do muro, é que querem enquadrar a crítica como sendo SEMPRE um “ser contra” ou um “ser a favor”.
O senso comum, que desde sempre está domesticado para tentar satisfazer a sua “vontade de trono” (nem que pra isso sejam as figuras da Revista Caras suas majestades) opera sempre na lógica primitiva da guerra. É a repetição contemporânea da guerra justa que aparece na história da filosofia: a guerra justa do senso burro. Eles querem o xeque mate, o mata leão, o delírio do nocaute no MMA que, agora narrado pelo Galvão Bueno, vai fazer as criançinhas rolarem e ralarem os joelhos nos pátios das escolas, querendo esganar o coleguinha, trucidá-lo a fim de que possam tomar posse de seus pequenos tronos.
O Mario Quintana e o Bukowski - se não me embanano com a memória - diziam que não há pior amigo do que aquele que elogia algo que, em nada, é elogiável. Esse descompromisso com o outro pela anestesia da não-crítica, por um eterno medo do não, põe um tapume nos nossos caminhos, empata qualquer construção. Afiem os dedos. Apontem os dedos. Com propósito e doçura.
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