Besta!
A verdade, que tem sido pra mim salvadora e vilã, é que desde que deixei o teu abraço lá na beira da lagoa, muito pensei em ti. Muito mesmo.
E enquanto eu pensava, percebi que era bom. Que era bom PENSAR em ti. Ficar pensando, e só. Porque quando eu pensava, a esperança sentava no meu colo como um cachorrinho de estimação que nos supre as faltas. Não uma esperança em relação a nós dois visto que um “nós dois” sequer houve, mas uma esperança em relação a tudo, à vida, ao mundo, ao meu existir, às manhãs que vão me obrigar à abrir os olhos enquanto o meu paraíso onírico fecha as cortinas. Tudo poderia ser bom, se tivesse a mesma aura que tinha enquanto eu pensava em ti.
Lembrei da tua risada de menina e toda a moldura de flores que enquadravam teu rosto em cada sorriso.
CLARO que eu via essa imaginura só e tão só na minha imaginação. Mas quem vai ter o topete de dizer que as imaginações não existem? Eu andava pra lá de Bagdá, é verdade, mas a questão toda é que EU VIA, via em cada sorriso teu uma tela. Um quadro desses feitos por quem entende do assunto da pintura: Chagall e companhia limitada. Então, que ninguém se atreva a dizer que o quê eu via era uma alucinação, porque se eu via, existia. Isso até pode nos ajudar a entender que as alucinações não merecem esse nome de batismo já que existem da cabeça de quem as têm.
Ontem, voltando do retiro das consciências livres, enquanto a estrada vinha diante dos meus olhos, desliguei o som do carro, com o ouvido cansado do barulho, a consciência toda pesarosa porque minhas sensações estavam longe de ti, fiquei lá, absolutamente sozinho no micromundo do carro, pensando em ti.
Num momento íntimo e abstrato que foi só meu e que, mesmo sendo só meu, foi também teu, porque no pensamento tu estavas.
E como pensar é estabelecer um projeto, cheguei a conclusão nenhuma porque, na bem da verdade, não sei se tu poderias ter sido a mulher dos meus sonhos mais coloridos, se poderia ter sido uma paixão de carnaval que não aconteceu, se poderá (agora no futuro) algum dia ser minha em algum instante ou se, simplesmente, o que passou lá no meio daquelas árvores mágicas, já passou, e eu sou apenas um sonhador que gosta de manter as puras sensações que sinto bem vivas na alma.
Foi mais ou menos isso que senti quando lembrei de ti.
Digo mais ou menos porque só podemos explicar as sensações "mais ou menos" mesmo.
Mais ou menos assim que as fotos traduzem os instantes. Lembra daquela nossa foto com os pés soltos e em comunhão no chão de grama?
Nossos pés ali, flertando, tentando algum entendimento. Apreendemos aquele instante na foto.
Meus pés sujos ao redor dos teus protegidos pelos tênis, aquele abraço de pernas, minha panturrilha nos teus joelhos, alguma coisa em mim que queria te proteger e que a psicanálise vai tentar explicar de algum jeito todo teórico, aquele momentinho de curar a alma, aquela pequena inconsciência que nos lembra que o amor é o grande rei da história e que,se talvez os cruzamentos do destino mirassem em nossas testas como uma arma de precisão da CIA com aquelas luzinhas vermelhas, assim como se o tiro fatal fosse paradoxalmente um prêmio, talvez assim, poderíamos ter provado com a ponta da língua o amor por meio do beijo que não houve.
Teve a graça dos corpos e a sincronia toda com a dança que fizemos no cobertor atirado na grama,
teve o churrasquinho,
teve o teu cheiro que era o perfume bom do teu shampoo,
teve o equilibrio na grama com meus calcanhares nas tuas ancas e as nossas 4 mãos pensando que eram 2,
teve o colo final e o "vamos fugir",
teve o roçar proposital dos meus dedos em ti,
teve o toque despropositado (?) no teu peito.
As mãos, confesso, queriam mesmo era encostar na tua pele quando disfarcei meu desejo com uma massagem.
Teve mais.
Mas o que mais teve é só nosso.
E essas coisas ficarão gravadas mesmo que a gente nunca mais cruze os olhares por ai.
Sabe-se lá o dia de amanhã!
Mas o passado, esse sim, é nosso.
(esse excesso de "enter" é uma denúncia de que a poesia foi inevitável)
O passado é a única coisa que podemos portar, para honrarias ou vergonhas ou vergonhas que são a causa das honrarias do presente.
Eu gosto do passado porque posso guardá-lo.
Acho que sou um colecionador de memórias. E as boas, como essa que tivemos, fica na seleta ala das memórias raras, que são aquelas que sabemos de antemão que não se repetem todos os dias, aquelas que se constituem de dias-exceção.
Vai ver os estados de exceção podem ser, além das guerras, também os dias mágicos. Vou mandar um email para o Cristóvão Buarque sugerindo a criação de uma emenda constitucional para acrescentar os dias mágicos como estados de exceção. Se der certo e se o destino nos aproximar as peles e os corações de novo, será decretado oficialmente, com chancela de alguma autoridade e tudo mais, o DIA DA MAGIA, que são esses dias raros em que temos a única overdose que não mata: a do amor e do afeto.
Puta merda.
Que memória.
Que memória lindíssima essa nossa. Vai ficar em mim durante toda a vida, vou lembrar de tudo que passamos mesmo quando eu tiver caindo aos pedaços.
E já concluindo sem concluir, posto que a memória é um cheiro que (volta e meia) volta, podes tu concluires que te amei, simplesmente.
Profundamente sedutor!
ResponderExcluirComo demora a decantar... até que sai uma bela declaração de amor, com as confissões agora libertas... por tudo o que foi e jamais será esquecido. Lindo, Paulo! Beijo!
ResponderExcluirBah Lu, fiquei pensando no teu "decantar"...como se todas letras ácidas fossem o prelúdio de um poema de amor.
ResponderExcluirBeijão
Realmente, é uma declaração de amor muito linda, feliz dela! Lindo você (digo o seu eu "mago")! Abraços
ResponderExcluirPorque o coração dói? Porque temos a sensação de nó na garganta e aperto no coração? Que sentimento é este?
ResponderExcluir