terça-feira, 20 de dezembro de 2011

ELOGIO AO ÓCIO





Alguns chamam de preguiça,
outros de vagabundagem.
O batizaram de irresponsabilidade,
de descompromisso, de falta de objetivo.


As coisas são ociosas,
mas só um homem pode usar a palavra ócio.
As coisas ociosas, como uma geladeira sem uso,
uma televisão 40 polegadas com tubo de imagem pesada como uma vaca morta,
ou uma tranqueira guardada em algum lugar de tranqueiras ociosas...
- tudo isso são coisas que não podem dizer que desfrutam do ócio.

É como a coisa-em-si que nunca conseguirá ser a coisa-para-si, isto é Sartre - bom que se o saiba!
As coisas-em-si não podem se vangloriar da ociosidade que experimentam.

É por isso que ainda guardo esperança pela raça dos homens,
em lampejos de otimismo (ou seriam lampejos de madureza?)

Posso ir até a hora em que as coisas forem ao meu redor:
essa é a fortuna do ocioso.

Fazer nada.

Deitar sobre o nada.

Não esperar nada do amanhã.

Não pretender o amanhã, nem a hora seguinte, nem mesmo a próxima música...

Meio assim, entrelaçando-se com a grande comédia da vida,

toda a mudez irônica de nossas vozes sem alcance,

toda a graça ambulante do nosso bolo de farelos humanos,

toda essa comédia, engraçadíssima, de não ser nada,
nadica de nada, o farelo do peido do cachorro do grande Monstro,
ou o farelo do peido divino do nosso Grande Síndico Divino...

ou ainda de ser apenas um peido ocasional, de uma tarde monótona, cotidiana,
sem novidades, nem dores nem orgasmos de porco,
neutra, moribunda, insossa...
um peido sem persistência, sem barulho, sem fedor.

*

Olhem aqui nos meus olhos,

Com seriedade!

Me olhem como quem quer realmente escutar o que diz a alma,

Ouvir como quem pretende ver com os ouvidos...

Me olhem com toda paradoxalidade,

Me olhem como quem olha o mundo que se dobra ante o vento que vale a pena.

Me olhem com nudez, vontade, concentração.

Me olhem estando prostrados diante de mim.
Me olhem no grão do olho seus filhos da puta, seus miseráveis
Me creiam: a miséria dos ócios determina a infância das almas.

Me creiam, almas juvenis:
saibam aceitar o estado de pureza de tudo que é vão e em vão.

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