segunda-feira, 18 de abril de 2011

FABULÁRIO DE UMA FAXINA


Fedor insuportável e sensação de que se vive num hospício são sentimentos constantes pra quem mora sozinho. Minha faxineira sumiu e a coisa começou a degringolar. Ela me enganou. Elas dizem que vem, e acabam não vindo. Vagabunas de merda. Vai ver ficam com preguiça e, se for por isso, tudo bem. Quando alguém vai inventar um site de faxineiras? Ta aí uma boa ideia! Se alguém quiser roubar a ideia fique à vontade porque eu não tenho saco para os negócios. Deixo isso pros sapientíssimos administradores de empresa e outros porcarias burocráticos do tipo.

Da última limpeza até o dia D passaram-se uns 20 dias. Sim, 20 dias. E não mexi um dedo pra arrumar nada durante os 20 dias. Falta de tempo, preguiça e esperança de que uma faxineira chegasse por teletransporte foram deixando a coisa se aproximar do caos. A casa tinha virado o chiqueiro de um porco-mor que era eu. Também funcionava como um teste pra um cara que tinha sido criado com o modelo de que as coisas tinham uma ordem. Ficar em paz no meio do caos é um bom exercício pra aquisição do atributo da psicoliberdade, conceito cardinal de um projeto em andamento que será comentado aqui. Ou não será comentado aqui.
Tinha uns tuchos de cabelo espalhados pelo chão que pareciam ácaros aumentados no zoom 100x. Quem já viu uma foto aumentada de um ácaro sabe que estou falando de um verdadeiro pandemônio microscópico que causa um tsunami no nariz de um alérgico como eu. Às vezes penso que o meu nariz, que já é um cotovelo, nasceu APENAS pra aporrinhar a minha vida. Funga, coça e produz cravos que devem ser bem parecidos com merda de ácaro. Queria um nariz destacável, que pudesse ficar coçando fora de mim.

Um farináceo de sujeira composto por farelo multi-origem, pó, areia, pêlos também multi-origem, restos de comida e restos de pele morta que servem de alimento pros ácaros pandemônios; ficavam grudados na palma do pé enquanto eu caminhava descalço pela casa.

Uma borda seca de pizza tava há 5 dias no mesmo lugar da sala, pensei até em dar um nome pra ela mas achei MUITO imbecil a ideia 2 segundos depois que a ideia nasceu. Os sapatos inconjuntos espalhados pela casa com meias fedendo muito depois que o molhado do suor secava. Não tinha mais uma puta cueca limpa. E aí é claro que a gente começa a repetir, sempre selecionando as que estão menos piores. Todo homem já fez isso alguma vez na vida. E pensamos sempre: “bom, hoje não vou comer ninguém mesmo”. Se por acaso pintar um sexo surpresa o negócio é tirar a cueca junto com a calça sem aquele ritual católico de ir devagarinho, no estilo padre filho da puta que quer comer o coroinha e começa oferecendo um pirulito pra depois tentar enfiar o pirulito no guri em nome do nosso senhor jesus que veio à terra pra ensinar coisas boas e técnicas retóricas pra comer o cú dos coroinhas.

Quando as cuecas confortáveis já estão podres, a saída é pegar as cuecas desconfortáveis, aquelas que já deviam ter sido doadas pra que o filho da faxineira sofra com os problemas dela porque ele é um cara que não teve a sorte de ser um espermatozóide com potencialidade burguesa... Algumas cuecas são batizadas pelo diabo que deve lançar alguma magia negra que faz a cueca ficar apertando o saco ou entrando na bunda ou com alguma etiqueta que fica pinicando a pele o dia todo.

Copo limpo também não tinha mais. Passei a beber tudo no bico e percebi que além de ser mais prático, mantinha os copos intactos. A técnica de beber no bico torna os copos dispensáveis. O lençol, já dá pra se imaginar! Tava com uma camada natural de uma banha também natural. Só não tava pior que um lençol que usei no intercâmbio por 6 meses a fio. É impressionante como somos um saco de merda. Pra ajudar esqueci uma caneta marcatexto (será que agora marca texto é marca-texto, marcatexto ou marcattexto com essa porcaria de reforma ortográfica? Ah que se foda essa reforma) aberta na cama que deixou uma enorme mancha verde-limão no lençol. Numa noite dessas acordei no meio da madrugada pra mijar e achei que o fantasma de uma mulher marciana menstruada tava dormindo comigo. Fiquei apavorado até lembrar que a mancha era da caneta.

Nas duas últimas noites antes do dia D, que foi o dia em que me obriguei a limpar a casa porque percebi que a casa estava tirando minha saúde, eu tinha dormido pouco. Com o sono atrasado, viajei pra estudar conscienciologia que é uma revolução que outra hora eu conto com mais calma. Era sábado, 22h, podre de sono e com o cansaço pesando nos ombros. No domingo teria que levantar às 6 pra ir de novo pra merda do curso, que é interessante mas é uma merda porque começa num horário fodido de domingo. Em outras épocas eu ia me sentir mal por estar sozinho em casa num sábado de noite, ainda mais limpando a casa. Hoje em dia já sei que a salvação não é se enfiar num lugar quente, sem lugar pra sentar e cheio de gente imbecil que frita a cabeça e a minha paciência. Só com muita cerveja pra suportar esse martírio.

Não tinha choro, o negócio era meter a mão na imundície. Coloquei meu calção que já tem 13 anos de vida (com um cheiro de saco since 1998) e incorporei o caça-imundície. Primeiro coloquei a roupa na máquina que ia ficar trabalhando por mim. Eu sabia onde deveria colocar o sabão e o amaciante, o problema foi o quadro de mil opções de lavagem, pré-lavagem, centrífuga delicada e não sei mais o quê. Pra quê serve uma PRÉ-lavagem? Pra roupa ficar pré-limpa? Se alguém souber peço uma breve explicação. As conexões possíveis daquelas tabelas de máquina de lavar roupa são mais complicadas que acertar na mega-sena. São MIL possibilidades e combinações. Só com faculdade pra entender. Como achei tudo muito normal, selecionei o “NORMAL” em todos os botões. Claro, separei as coisas coloridas das brancas como minha mãe ensinou. Não deu certo porque ainda somos todos platônicos demais e aristotélicos de menos. A regra a priori não funcionou porque não previu que uma caneta podia manchar as roupas. Manchei todas as roupas brancas de verde limão porque a merda da tinta do lençol se desprendeu e manchou todo o resto.

Fui pra cozinha. Quando comecei a mexer nos pratos vi que a coisa tava pior do que eu imaginava. Tinha risco de alguma coisa ter criado vida embaixo dos pratos, por isso mantive o RAID por perto. É uma marca muito boa. Meti a mão na massa e lembrei do dito: “se mexer a merda fede” – pura verdade. FEDIA MUITO. Pelo menos as formigas filhas da mãe estavam todas mortas dentro dos copos. Elas acabaram se ferrando porque pensaram que sabiam nadar nos restos de suco. Ou então foi uma overdose de açúcar (será que as formigas morrem afogadas ou de overdose?) Senti a lombar e tive que descansar no sofá tomando uma cerveja. Pelo menos ainda tinha umas cervejas pra salvar a pátria.

Sentado no sofá meditei: “já que to limpando essa merda, vou limpar TODA essa merda”. O chão me olhou e eu olhei pra ele. Os imbecis tentando pegar as meninas na festa pensando que os problemas iam acabar. As imbecis exibindo os silicones e o cabelo escorrido e bebendo pra criar coragem pra trepar. No final os múltiplos casais de imbecis iam trepar sem consciência e comentar com os amigos e amigas no dia seguinte, repetindo o ciclo no final de semana seguinte até o dia em que cansam e inventam um amor só pra não ter que voltar praquele inferno quente e sem cadeira. Pequenos imbecis seriam gerados. As pessoas não sabem ficar sozinhas e a estabilidade mental depende muito disso. Enquanto tudo isso acontecia eu arredava os móveis e talvez o desgraçado fosse eu sem sequer perceber que era um.

Os tuchos se mexeram no chão, sentiram que a mamata tinha acabado. Levantei os tapetes. Os ácaros entraram agrupados em 200 alas de 10.000 cada em direção às minhas narinas que deviam ser dois buracos negros pra eles. Muitos espirros se seguiram. Terminei a louça já completamente sem paciência. Depois que terminam as coisas grandes têm os talheres, fatigante, muito fatigante limpar talheres. Vou começar a usar os de plástico.

A vassoura é feita pra pessoas de 1 metro e 30 ou pra gente que gosta de varrer ajoelhado. As formigas fizeram uma conferência extraordinária na sala pelo estado de emergência que tinha se instalado na casa que, àquelas alturas, era mais delas do que minha. As coitadas não tavam entendendo nada dos meus movimentos pró-limpeza. Enchi o balde e fiz uma poção mágica com os produtos que tinham no armário da limpeza. Comecei a passar o pano. Eu nunca tinha lavado um chão antes. Talvez as faxineiras recebam pouco pelo que fazem. Dizem que só os grandes mestres budistas ganham a possibilidade de limpar o chão. Que só ganham o prêmio de limpar o chão depois que aprendem a comandar a própria mente. Eu não comandava nem a mente nem as costas que estavam cada vez mais felizes e tinha que limpar o chão. E percebi que durante quase 30 anos eu nunca tinha limpado o chão que eu pisava. É preciso estar nos lugares pra entender. Por isso quanto mais lugares melhor. Quanto menos, muito pior. As costas estavam bem felizes mas ainda preferem a cama.
PS: Esse programa da RedeTv é a única coisa que presta na televisão no tempo em que eu sento a bunda pra ficar como uma anta vidrada na frente de uma televisão. Pelo menos presta pra rir e tem bundas ótimamente artificiais, como os peitos de galinha que a gente come no almoço.


13 comentários:

  1. O negócio é tu casares logo. As mulheres nunca deixam chegar a esta situação, no começo tu leva uns xingamentos, mas no final termina tudo em festa.
    Obs: Não estou sendo machista e sim realista.

    ResponderExcluir
  2. hahaha eu imagino o estado da casa e me lembrei da história do pai, melhor casar Paulinho!!

    Morri com a psicoliberdade, só vc!!! Lembre-se, vc já me contratou, ministrarei aulas sobre liberdade.

    Pré-lavagem só serve para gastar água, nada ecológico. Fez o melhor ao optar pelo normal.
    Ah, o tal site já existe.Joga no google que deve existir um na sua cidade.

    bjos querido!

    ResponderExcluir
  3. Quanta teimosia! hahaha

    ResponderExcluir
  4. Só imagino que cena hilária, você fazendo faxina...

    A dica é não deixar num estágio de tanta calamidade meu bem...
    Olha, se casar parece uma boa saída, talvez possa não ser, salvo se a mulher for seu extremo oposto. haha!

    Querido, também nunca entendi muito bem, as mil opções de lavagem dessas maquinas.
    A intenção da “pré-lavagem”, parece ser mais ou menos o “tirar o grosso” sabe? Algumas roupas nem precisam desse processo todo, mesmo porque, é típico de quem quer gastar água mesmo. Na dúvida, considerar a lavagem como normal, parece ser a melhor forma...

    Desculpe, mas acho que sei por que a faxineira fugiu! Hahaha..

    Beijos!

    ResponderExcluir
  5. Pois é Bruno eu ando querendo casar, só me falta a mulher.
    O projeto psicoliberdade é sério Érica, seríssimo, não fique ai agorando. Vou ver se tem um módulo pra ti.hahaha

    Não tinha pensado que a faxineira pode ter fugido de medo da imundície...

    ResponderExcluir
  6. Meu avô, Sr. Narciso, na sapiência de seus 102 anos sem fazer rodeios pregava... "Casar é a maneira mais CARA de ter a roupa lavada e a casa limpa DE GRAÇA''. Melhor ficar como está amigo... afinal uma faxina de vez em quando é bom para sair da inércia e mexer os ossos. Valeu...

    ResponderExcluir
  7. Mas que hipocrisia desse pessoal, hein, Paulo: como se ninguém tivesse os MESMOS PENSAMENTOS que vc, solteiro assumido ou casado feliz e/ou entediado. Humpf.

    Falta de mulher ou de homem não dá sujeira, não: dá tesão enrustido.

    Sujeira é causa de falta de vergonha na cara. Confesso, já que, durante minhas aulas de mestrado, cerca de DEEEZ meses, meu carro ficou sem ver nem uma gota d´água - logo o meu carro, que costumava receber de mim pretinho e silicone (o silicone que dá brilho, não os dos peitos - estou feliz com os meus). Além disso, atualmente, nessa correria que estou, meu quarto só é arrumado pela cama, enquanto o pó protege os móveis contra arranhões. Isso, lógico, sem falar nos meus livros que já viraram biblioteca de paranho.

    Pois bem, sou salva por minha mãe, que me garante a limpeza da minha mãe e de tantas outras coisas que não me atingem diretamente.

    No fundo, então, para nós, ocupados e independentes, podemos equivaler falta de vergonha na cara à falta de tempo.

    He he :P

    ResponderExcluir
  8. "Seeee todos fooossem, iguaaaais a você. Que maravilhaaaaa viver"

    ResponderExcluir
  9. *limpeza das minhas roupas :P

    hehehe xD

    ResponderExcluir
  10. Aqui em casa as formigas já estão me carregando, sem discussão.
    Não conheço ainda seu AP novo amigo, mas creio que ia ser mais difícil ter limpado os 2 mil metros quadrados do Ap do seu Rui...

    ResponderExcluir
  11. gargalhadas
    Paulo, és ótimo! (acho que já disse isso)
    De qquer forma, além do teu estilo Bukowskiniano... hahahahah... ainda há uma acidez, um mau humor, contagiantes! Me vi conversando contigo... e, pelo jeito, a pré-lavagem da máquina serve tanto quanto serviu a tua pré-limpeza da casa, pois imagino o quanto ainda havia a limpar, já que nem no banheiro chegaste! hahahah
    Beijos, querido!

    ResponderExcluir
  12. é beeeeem menor que o do Seu Rui Estevan hahaha.
    Querida Lu, brigado pelo incentivo. Sou um legítimo copista do Buk mesmo, não achei ninguém melhor que ele até hoje.
    Beijão pra ti

    ResponderExcluir
  13. Limpar a casa é terapia Paulo, desde que não seja obrigação. hehehe. O segredo é não deixar acumular :) Dei muitas risadas com teu texto!!!! Beijoca faxineiro :P

    ResponderExcluir