sexta-feira, 12 de abril de 2013

ok ok






ativo, caminho pelas ruas de mim mesmo com um passo cansativo. Demandas lá de fora, fazem com que eu extravie o GPS aqui de dentro. Há uma saudade de só ficar sendo, de só estar ali, de só ser o que se pode ser, de se resignar sem qualquer culpa. Tenho trabalhado, metido o martelo na pedra dura – e faço por amor à fadiga. Canso o corpo pra não ter que enfrentar o espírito. Tem horas que a vida mete um espelho microscópico na frente da gente. Aí podemos ver tudo que é podre, impuro, minúsculo, feito de nada...toda a pequeneza que significa tudo que a gente ACHA que é. Uma coisa tipo: a humildade comendo o cú da arrogância, do ego. Peguei um filhote de gato pra morar aqui comigo. O bicho não durou nem 3 dias. Miava o tempo todo. As formigas dominaram o pote de comida dele. Cagava no tapete de um modo superior, arrogante e ingênuo, vencendo o cabresto de cagar SEMPRE no mesmo lugar. Mas merda de gato novo FEDE. E aí tem que por sapólio. E esfregar COM DEDICAÇÃO um pano que eu acabo sempre jogando fora, afinal, ninguém merece a desgraça de ter que LAVAR um pano cheio de MERDA DE GATO. Ele foi desmamado muito cedo. Os gatos também têm complexo de Édipo e querem ficar mamando nas tentas da gata mãe a vida inteira, sem ter que pagar imposto, aprender a cagar na caixa de areia ou ter que acordar cedo pra ir trabalhar. Mas, pelo menos por um período, todos têm o direito de ficar ali, existindo só pra chupar nas tetas de quem nos pariu. E foi isso que aconteceu com o gato que veio morar comigo. Ele não pôde sequer chupar o tempo nas tetas o temo que a vida nos legitima pra ficar só chupando as tetas. A vida foi cruel com esse gato. E entender porque esse gato veio parar no meio da minha sala é uma coisa, sobretudo, imbecil. Imbecil porque entender não passa de um interesse. De uma resposta ao desejo de saber. Entender sempre está divorciado de ter sensações. E são as sensações, terrenas, carnais, femininas, umedecidas de suor e vida, que valem a pena. Um corpo nunca será um corpo à toa. Ou será que os corpos nascem em série como a frieza de uma linha de montagem¿.
Ele era um gato carente. E porque era carente, ele MIAVA. Por exemplo, ele fazia - MIAU, e depois de  3 segundos, fazia  -MIAU de novo, e depois de outros 3 segundos, MIAVA DE NOVO. No primeiro dia achei legal. Segurava ele no colo com carinho e dei ele dormia, para felizmente para o MIADO I-N-C-E-S-S-A-N-T-E. Mas depois veio a segunda-feira. E com ela a CORRERIA desta vida filha de uma puta (daquelas bem vagabundas e caras).  Vieram os bancos, os sistemas que não funcionam, a vida dentro de um carro, a vida dentro de uma casa, a vida dentro do mundo abaixo do céu  com este mar andando pra lá e pra cá sem ter consciência de nada, as chuvas alagando a vida de quem mora perto da chuva, o caos, o redemoinho, Bob Dylan quase morto, Warat morto. Com tudo isso, chorei. E foi bom porque depois que a gente chora é um momento-túmulo. Uma coisa é a choradeira do velório. Outra é a do túmulo. Velar é quando ainda não é possível se conformar com a perda. Não existe nenhum charme num velório. O choro charmoso é o do túmulo e, mais ainda, do caminho até o túmulo. Aquele cortejo fúnebre indo, lento, com uma garoa que domina o barulho do choro.
Hoje eu chorei e tenho essa sensação de caminhar num cortejo fúnebre. Segurando a alça do caixão que tem o meu próprio corpo. Talvez seja bom. É uma sensação de estar morto, estando vivo. E não existe nenhuma razão pra eu não me tirar tanto do defunto quando do eu que carrega o caixão, pra ver a coisa toda como um terceiro personagem espectador.

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