quarta-feira, 14 de agosto de 2013

não vim ser feliz, vim ser humano






Onde estão os espaços por onde caminharei?
Onde estão os esgotos pra escoar, junto com o mijo urbano, também as minhas chuvas?
O quê veem os olhos do mundo, que são também meus?
O quê tem passado no filme dos sonhos daqueles que são capazes de dormir?
Por qual mão se atreve a textura da pele e do pelo mínimo da pele que não está mais?
Por qual pinça de dedos se arrepiam os mamilinhos das gurias de 18 anos,
das ovelhas que moram nas chácaras e
das cadelas domésticas das velhas aposentadas que ninguém mais quer comer nem sequer no escuro?
Onde está o peito que amanhã receberá a bala mortal e o coice da paixão?
Onde reinará o amor daqueles que são incapazes de amar?
Quantos mendigos haverão nas ruas dos meus 83 anos de tristeza de um sorriso sem dentes?

E quantas senhorinhas, enfim, chorarão meu peso morto de defunto,
descendo irônico pela vala que nunca me terá,
porque terei subvertido, na hora da vala, também à própria vala?

Percebo que não há em mim nada mais do que um antes e um depois,
um depois que é frágil igual a um espermatozoide que se debate como um peixe louco numa camisinha.

Sou um gatilho engatilhado em direção ao escuro.
Sou um galho torto que voltou a se enterrar só pela nostalgia da raiz.
E cogitando o flerte regresso do que foi, e mesmo a esperança,
contemplo a espera rememorando os murmúrios.
É um modo de dedilhar um gozo melancólico, ora precoce, ora letárgico.
É uma espécie de poder silencioso, robusto e vil,
que não serve para as coisas vivas do mundo.
O presente não me interessa.
O presente é uma gozada robótica que se dá antes de dormir.
Não posso deixar de detectar que o presente é a miséria dos felizes.
Assim como são miseráveis todas as coisas feitas de fragmentos.
Pretender pedaços é instinto dos bichos de zoológico alimentados por um pai idiota.
É tanta gente feliz, que eu me entristeço pra cooperar: 
fico triste pela função social de equilibrar o mundo.


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