sábado, 20 de julho de 2013

tópica




Você olha em volta
tentando encontrar a própria miséria, 
mas só vê paredes mudas de branco, cachorros que são felizes sem falar nada
e pulgas trabalhando por gotas minúsculas de sangue de cachorros que não falam nada.

Você olha por dentro, 
se transforma em um bacilo que caminha no meio do músculo da carne humana, 
ou então se sente um micróbio pequeno como o nada, 
nadando no mar gástrico que transforma tudo em merda. 

Mesmo assim, sorrateiro, não encontra a própria miséria. 
Então você resolve ir fundo, prescindir da matéria, 
e começa a acreditar no inconsciente, no cosmo, no raio que o parta, 
numa cruzada à caça da própria miséria, 
mas só encontra um oco, mudo, igual a um salão de baile em final de festa, 
quando as faxineiras que dormem e acordam cedo, 
começam a virar as cadeiras de pernas pra cima, 
como se atirassem corpos do patamar da vida para a morte.

Fora ou dentro ninguém diz nada, 
nenhum mestre dos magos e nenhuma bruxa maligna,
nem mesmo pra nos dar a direção errada do caminho. 
Ah a direção errada! Nem mesmo ela pra eliminar uma variável das direções possíveis.

A direção errada seria um rosto humano nu nesse baile veneziano de máscaras. Mas nem ela!
Terei o direito de ser proprietário da própria miséria?

Cogito a miséria como o ponto vélico do mundo, 
como o triângulo das Bermudas, 
como o buraco negro que fechará as cortinas do absurdo.
Deus estará lá, brincando de ser Deus, com uma máscara do Bozo ou com uma máscara de Deus.
Mas ele não é nem nunca será um filho da puta. 
Ele não nasceu no meio do sangue e das gororobas da placenta.
Ele é um deixado ao relento dentro de uma caixa de sapato numa parada de ônibus. 
A miséria dos que vivem é não poder parar.

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